Percorrendo a ampla estrada que de Manágua leva a
Chinandega, na parte ocidental da Nicarágua, nem
sempre é fácil evitar-se o desvio que conduz ao pequeno
povoado de Chichigalpa.
Não existe sinalização clara, a pessoa tem que ficar
dependente dos enormes cartazes publicitários do rum
“Flor de Caña” ou do açúcar do Engenho San Antonio, que
dão as boas-vindas a este lugar. Quando se chega de
fora, existe a clara percepção de que os produtos da
Nicarágua Sugar Estate Ltd
caracterizam a própria identidade dos chichigalpinos
e de seu povoado.
No entanto, o nome de Chichigalpa não é mais somente o
sinônimo de produção de açúcar e de rum, já que seu nome
também percorreu o mundo devido à dramática situação
vivida por milhares de ex-trabalhadores canavieiros
portadores de Insuficiência Renal Crônica (IRC),
bem como pela contaminação que afeta essa região.
A grave epidemia de IRC, que está dizimando a
população de Chichigalpa, é algo que já não pode ser
ocultado e que necessita de respostas imediatas, para se
contrapor ao desenvolvimento da doença, proporcionar
assistência especializada aos afetados e, sobre tudo,
para determinar as causas desta tragédia.
SIREL
conversou com o Prefeito de Chichigalpa, Wilfredo
Rostrán García, para saber qual o trabalho que esta
instituição se propõe a fazer para enfrentar o drama
vivido por milhares de ex-trabalhadores canavieiros.
-De que forma a prefeitura está enfrentando este grave
problema existente no município?
-Em nosso município existe muita gente portadora de
IRC. É algo que lamentamos muito porque o povo está
morrendo. Acabamos de formar uma Comissão
Interinstitucional da qual fazem parte a Prefeitura, o
Ministério da Saúde (MINSA), o Ministério do
Trabalho (MITRAB), o INSS e outras
instituições. O objetivo é buscar as causas desta
doença.
O MINSA nos orientou para que entrássemos em
contato com doadores e realizássemos gestões para a
obtenção de recursos externos a fim de apoiar uma
pesquisa que aponte as causas desta doença. Já existem
alguns avanços relacionados à parte técnica. Precisamos
definir o formato do projeto a fim de legalizá-lo agora
no seu início, para depois entrarmos na etapa do estudo
prevalente.
-Do que se trata?
-Trata-se de um estudo para detectar o grau de
incidência da IRC na população de nosso município
e, na fase subseqüente, já entraríamos na análise e no
estudo da água, que vem a ser a parte mais importante na
determinação das causas. Acreditamos que a IRC
pode ser originada pelas altas quantidades de
agrotóxicos aplicadas nos canaviais e nas áreas em que o
algodão foi semeado.
-Qual será o tipo de participação do Engenho San Antonio
neste projeto?
-Até onde sabemos, a Ministra da Saúde nos afirmou que o
engenho tem vontade de fornecer recursos para determinar
quais são as causas da IRC nesta região. Eles
sempre se protegeram dizendo que não têm nada a ver com
esse problema, mas nós acreditamos que não é bem assim
como eles dizem. Há muita confusão. Fala-se que existem
estudos específicos, mas que desapareceram ou foram
perdidos e que não se sabe onde estão. Do que temos
certeza é que a maioria dos portadores são pessoas que
trabalharam no engenho e que este estudo é necessário
para determinar, de uma vez por todas, a causa desta
doença. Temos que aproveitar esta oportunidade e
resguardá-la para que não acabe perdida como parece que
aconteceu no passado.
-A maioria dos portadores aponta o engenho como o
responsável por esta situação…
-Há grupos de portadores cujas juntas diretoras comentam
sobre esta situação e estes comentários são válidos;
devemos levá-los em conta porque são eles que sofrem com
a doença. A verdade é que esta situação já virou noticia
nacional e internacional, porque o problema é grave e a
cada ano morre mais gente. Não poderia lhe fornecer
dados exatos neste momento, mas de um número hipotético
de cem falecidos, a maioria é por IRC. É um
problema real que precisa ser resolvido.
-Não é segredo para ninguém que o Engenho San Antonio é
muito poderoso e contribui também com obras sociais que
beneficiam a população e a municipalidade em termos de
infra-estrutura. Se o estudo determinar algum tipo de
responsabilidade do engenho, a municipalidade teria
condições de apoiar estes resultados?
-Temos mantido, sempre, uma relação de respeito com o
engenho, no sentido de que ele tem o direito de
desenvolver suas atividades pagando os respectivos
impostos à municipalidade, para que possamos investi-los
em obras e em infra-estrutura. Temos procurado sempre
uma forma de aumentar os impostos ano a ano e até já
temos um processo contra a empresa, porque houve
resistência em reconhecer estes aumentos e agora estamos
esperando a decisão do tribunal. A meu ver, se
conseguirmos determinar as causas da doença e o engenho
tiver algum tipo de responsabilidade, terá de responder
por esta situação e o governo municipal estaria disposto
a dar um respaldo maior aos portadores e a apoiar estes
resultados. Como instituição, já estamos apoiando de
alguma forma, mas precisamos fazer ainda mais.
-O Engenho San Antonio declarou que não utiliza
agrotóxicos e que sua produção é limpa. Existe na
Prefeitura uma Comissão Ambiental que realize algum tipo
de controle?
Foi formada a Comissão Ambiental, mas não nos foi
permitido chegar até o engenho. Tínhamos o direito de
fazê-lo legalmente e também o direito e o dever de fazer
recomendações, mas na entrada do engenho existe um posto
de controle e não nos deixam passar. O que quero dizer é
que existe uma luta constante quando há necessidade de
realizar inspeções nos rios e nas canalizações de
dejetos industriais.
-O
senhor acredita que o atual governo esteja
verdadeiramente interessado em buscar uma solução para o
problema?
-Estou muito confiante no interesse do governo. Em uma
reunião intersetorial comentávamos o desastre ambiental
que se está vivendo na Nicarágua e o próprio
presidente orientou a Ministra da Saúde para que se
fizesse este estudo para determinar as causas desta
doença e para dar atendimento às pessoas portadoras de
IRC. Este estudo vai ser integral e não vai ser
feito apenas em Chichigalpa, mas também nos
departamentos de León e Chinandega. Como governo
municipal, iremos nos envolver diretamente e já existem
membros do Conselho Municipal que participam da Comissão
de Saúde e vamos dispor de parte do orçamento para
realizar o estudo.
En Chichigalpa,
Giorgio Trucchi
© Rel-UITA
12 de junho de 2007 |
|
|
|