Luxemburgo 2009

Encontro Intercontinental da RIPESS

Com Denise Boucher

Os sindicatos também devem ser

atores sociais de primeira linha

 

Denise é vice-presidenta da Confederação de Sindicatos Nacionais (CSN), de Québec, Canadá, que reune 2.800 sindicatos com 300 mil integrantes. A CSN foi uma das principais organizações participantes da oficina “Ação sindical e Economia Social e Solidária”, e a que apresentou um maior desenvolvimento sobre este tema. Em diálogo com Sirel, Denise explicou a importância da relação entre os sindicatos e a Economia Social e Solidária (ESS).

 

-O que é a CSN?

-É a segunda organização em importância no Canadá, é especificamente francófona e promove um modelo de sindicalismo democrático e livre. Agrupa o conjunto de diversos setores como o da saúde, educação e outros do âmbito público, e também do privado como os setores metalúrgicos, florestais e outros.

 

-Como vocês entraram na prática da economia solidária?

-Esse início ocorreu já faz uns quantos anos, e entramos porque percebemos que as trabalhadoras e os trabalhadores eram explorados pelos bancos financeiros ou de crédito e, portanto, decidimos fundar um organismo que se chamou ACEF visando proteger a economia das famílias, ajudando-as a calcular orçamentos para os gastos ou lhes mostrando onde podem conseguir um crédito com juros mais baixos. Esse foi nosso primeiro objetivo. Depois instituimos a Caixa de Economia de Trabalhadoras e Trabalhadores que, faz alguns anos, se transformou na Caixa de Economia Solidária. A decisão foi dos próprios sindicatos que primeiro estabeleceram um fundo para atender as necessidades durante as greves e os conflitos, mas que também servisse para promover empresas de economia solidária e sustentar organizações culturais.

 

-Você pode dar um exemplo?

-O Cirque du Soleil, conhecido por tanta gente ao redor do mundo, é uma forma de cooperativa e não conseguia obter empréstimos dos bancos convencionais. Vieram até a nossa Caixa e tivemos o prazer de ajudá-los no inicio deste grande empreendimento. Apesar de agora movimentar milhões de dólares, o Cirque du Soleil continua mantendo as suas contas em nossa Caixa e, dessa maneira, contribui para que possamos seguir desenvolvendo constantemente nossa política. Outro aspecto importante de nossa ação neste plano é a ajuda às empresas recuperadas pelos seus trabalhadoras e trabalhadores. Temos um departamento chamado MCE Conselho que é composto por economistas e técnicos fiscais. Quando ficamos sabendo que alguma empresa, com sindicatos nossos, está em dificuldades corremos para assessorá-la, e geralmente essas empresas falidas viram empreendimentos cooperativos que praticam a democracia no trabalho. Resumindo: damos sustentação aos nossos sindicatos em ação e, em segundo lugar, respondemos a necessidades sociais com as quais nos comprometemos.

 

-E funciona?

-Claro que sim. Em 1998, no marco da Cúpula sobre o Emprego, o governo de Québec organizou um grande Fórum do qual participaram as organizações da sociedade civil, durante o qual decidimos por unanimidade fundar -com o apoio do governo- o Chantier* de Economia Social que é a instância principal de coordenação institucional na economia social e solidária, e de cujo Conselho de Administração participamos há muito tempo. Ou seja, em Québec existe uma cultura sobre isto, a ESS, mas também procuramos dar sustentação porque ela é pouco, ou quase nada, conhecida pelas grandes instituições financeiras e, portanto, nos dotamos dos mecanismos necessários para promovê-la. Também pusemos de pé o Fundo de Ação, que é uma caderneta de poupança previdenciária, onde a pessoa coloca dinheiro para ter uma melhor aposentadoria, mas que realiza investimentos em cooperativas ou empresas de ESS. Não pensamos que toda a economia deva ser social, ou que todas as empresas devam ser do Estado, mas nossa opção como sindicatos é fazer o que pudermos para que as empresas de ESS possam ser viáveis.

 

-Para muitos o vínculo entre a ESS e a ação sindical não é visível. Por que é importante para vocês?

-Diria que é importante para toda Québec. Somos a única província francófona do Canadá e, ao mesmo tempo, muito próxima dos Estados Unidos. Para nós, é essencial destacar os traços que nos fazem uma comunidade diferenciada. Acredito que nossos integrantes entendem perfeitamente que, se por um lado nos ocupamos do campo social, não deixamos de priorizar e de atender a ação sindical, a negociação, a mobilização, as greves e demais. Mas também devemos ser capazes de intervir fortemente no campo social. Há muitas razões para isso, mas principalmente queremos fortalecer um setor capaz de criar os empregos que, por diversas razões, vai destruindo o sistema hegemônico. E o governo, portanto, tem a obrigação também de apoiar e dar sustentação a este setor que tem capacidade de absorver parte do desemprego.

Quando o atual primeiro ministro, Jean Charest, assumiu o mandato pela primeira vez, agora está em seu terceiro mandato, pretendeu destruir a CSN, não somente em nossa ação sindical, mas também como promotora do movimento social. Não conseguiu, porque inclusive os grandes jornais, que são capitalistas neoliberais, sabem perfeitamente que não podem nos atacar porque seria como uma agressão à nossa idiossincrasia, à imagem de Québec para o interior do Canadá.

Apesar de receber críticas, como qualquer organização sindical, também recebemos expressões de apoio ou pelo menos de reconhecimento pelo nosso trabalho.

 

-Que balanço você faz da Oficina sobre

 “Ação sindical e ESS” em Luxemburgo 09?

-Estou bastante satisfeita, já que fomos nós quem solicitou que esta oficina fosse organizada, porque pensamos que temos que ser capazes de mostrar aos nossos amigos sindicais modelos diversos de integração entre sindicatos e ESS. Nosso modelo não é perfeito, entretanto está muito avançado em relação com o que vimos na Oficina. Também sentimos que há organizações, principalmente as européias, que veem nossa ação sobre a ESS como um gesto mercantilista, mas para nós é uma forma de sustentação, um apoio social, o que é bem diferente. Em nossa opinião, os sindicatos devem ser atores sociais de primeira linha, devem estar comprometidos com a luta contra a pobreza, por uma maior igualdade entre as regiões, e também ser uma ajuda para criar riqueza por meio de um modelo diferente ao neoliberalismo, no qual as pessoas não se sintam tão exploradas como no capitalismo. Acredito que esta atitude cria espaços de diálogo e isso, nestes tempos, já é um grande êxito.

  

 

En Luxemburgo, Carlos Amorín
Rel-UITA
12 de junio de 2009

 

 

 

 

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