Espanha
Conclusões IV Foro por um Meio Rural Vivo
Pela Soberania Alimentar dos Povos |
As pessoas presentes neste IV Foro por um Meio Rural
Vivo, representante de nossas próprias experiências e ações
cotidianas, de nossas lutas locais e globais, de nossas
esperanças e ideais, unindo sensibilidades diferentes pela
construção de outro meio rural vivo e com futuro
manifestamos: somos camponeses e camponesas, jovens,
mulheres diaristas, militantes de movimentos sociais e de
organizações não governamentais, consumidores e ecologistas,
a diversidade é nossa força. Somos uma representação de um
meio rural que quer viver dignamente pese às políticas
neoliberais e destrutivas que nos ameaçam desde faz décadas.
Estando convencidos e convencidas de que a luta pela
soberania alimentar dos povos é uma luta global que no
envolve a todos e todas, tanto no Norte como no Sul. É uma
luta por um modelo de agricultura e alimentação a favor de
toda a sociedade, da daqui e a dali e que é necessário
construí-la desde o local, desde o cotidiano.
Queremos como resultado de nosso trabalho compartido
nestes dois dias manifestar os desafios e planejamentos para
uma luta comum e contínua desde este espaço que é uma
aliança de pequenas experiências significativas e
transformadoras.
As conclusões de nosso trabalho constituem um programa
político de ação que se concretizam em:
1.
Exigimos o direito de produzir alimentos. Para isso é
necessária OUTRA
POLÍTICA AGRÁRIA COMUM construída desde um
modelo de exploração agrária familiar e sustentável social e
ecologicamente. Que favoreça preços remuneradores do
trabalho dos e das camponesas e que seja solidária e não
destrutiva dos direitos dos e das camponesas do Sul. Uma
política Agrária orientada aos mercados locais e regionais.
Para isso é
necessário seguir difundindo e debatendo com
todos os grupos sociais tanto do campo como da cidade o
modelo de Política Agrária que defendemos, e construindo
alianças com o resto de organizações da Europa. Unirmo-nos à
Campanha que a CPE junto com outras organizações agrárias de
todo o mundo lançarão o dia 17 de abril deste ano.
2.
Para garantir uma atividade agrária e pecuarista sustentável
no meio rural é necessário exigir
PREÇOS REMUNERADORES DO
TRABALHO AGRÁRIO. O agricultor e a
agricultora devem poder viver de seu trabalho.
Para isso é necessário
um controle da produção que ponha fim ao modelo produtivo e
que freie os excedentes. Não é possível avançar para um
preço remunerador sem gestão da oferta e da demanda de
produtos agrários. Exigimos de novo um preço garantido para
toda Europa e que este se veja compensado de forma acessória
para as produções procedentes de zonas agro-climáticas ou
socialmente mais desfavoráveis. O controle da produção só é
possível se combinadas diferentes medidas que vão desde o
estabelecimento de limites na produção, até os limites por
terra disponível, à redistribuição dos direitos de produção
com critérios eqüitativos e sociais, a não comercialização
destes direitos e o impulso dos mercados locais. Reclamamos
uma campanha de informação sobre os efeitos das comerciantes
e distribuidoras, dirigida fundamentalmente à cidadania.
3. O MODELO DE PRODUÇÃO AGRO-ECOLÓGICA E A
NECESSIDADE DE UM CONSUMO RESPONSÁVEL
são básicos para a construção da soberania alimentar. Esta
se constrói desde a cooperação de experiências baseadas numa
relação direta entre produtores e produtoras com
consumidores e consumidoras que se organizam coletivamente e
se relacionam desde o reconhecimento e mutuo respeito em
reciprocidade e transparência. É fundamental procurar formas
de cooperação com coletivos que promovam a educação e
transmissão de valores para a vida. É necessário gerar
âmbitos de educação formal e não formal sobre tudo entre os
coletivos populares do campo e da cidade. Cremos necessária
a elaboração de materiais educativos, novas metodologias de
aprendizagem e a geração de espaços de intercâmbio para
conseguir os fins anteriores.
4. A ALIMENTAÇÃO É UM DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL
que os estados devem respeitar, proteger e garantir de forma
direta ou indireta frente a violações de outros grupos ou
organizações internacionais e fundamentalmente frente à ação
das grandes multinacionais da alimentação que copam o
mercado mundial. Este direito gera obrigações nacionais e
internacionais que os estados devem assumir. Neste momento
diversas organizações da Plataforma Rural estão trabalhando
de forma específica este tema através de uma campanha de
sensibilização e difusão do conteúdo do direito.
Consideramos necessário dar um passo na linha da ação e da
denúncia gerando uma
rede de emergência que denuncie os casos concretos de
vulneração do direito humano a alimentação.
A Coordenação de FIAN na Espanha poderia assumir este
desafio de maneira concreta estimulando a divulgação de
casos que o resto de organizações e grupos conhecemos.
Consideramos como de especial transcendência o impacto dos
acordos de liberalização comercial da agricultura no direito
à alimentação dos países mais empobrecidos. Consideramos que
os alimentos não podem ser considerados como uma simples
mercadoria pelo que exigimos que a agricultura saia fora da
OMC
5.
É necessário repensar para fortalecer o conceito de
DESENVOLVIMENTO RURAL
considerando as políticas públicas impulsionadas em aras de
este objetivo. Consideramos que é necessário superar os
espartilhos políticos que marcam certas iniciativas de União
Européia como as únicas válidas e contrastadas. Se quisermos
um meio rural vivo será necessário desenvolver e implantar
políticas que busquem um desenvolvimento rural harmônico
onde a pessoa seja o centro do mesmo e que permita viver com
dignidade e satisfazendo as necessidades e aspirações de
qualidade de vida. Queremos um desenvolvimento rural que
responda às reivindicações efetuadas pelos próprios
habitantes do meio rural, que dignifique o trabalho em
especial dos agricultores, pecuaristas, pescadores, mas
também que reconheça todos os trabalhos que tem sido
desvalorizados econômica e socialmente. Um desenvolvimento
rural que reconheça o papel da mulher e sua capacidade para
liderar processos políticos e econômicos de mudança. Um
desenvolvimento rural que potencie a capacidade de
participação, decisão e autonomia da gente do meio rural.
6.
É necessário construir
outro tipo de relações
não instrumentais, senão de co-existência e cooperação entre
o CAMPO E A CIDADE.
Para gerar estas relações de diálogo construtivo, é
necessário que a voz dos e das habitantes do meio rural se
ouça e se considere: Não há melhor forma para isso que
comunicar e difundir os milhares de experiências positivas
que hoje estão se desenvolvendo e que propõem novas formas
de produção, relação e construção de alternativas. Por outra
parte é necessário que a gente do meio rural favoreça um
clima de acolhida para que as pessoas que procedem do âmbito
urbano vejam no espaço rural um lugar onde poder por em
marcha iniciativas que sejam respeitosas com todos os
valores enunciados. Constatamos a grande quantidade de
pessoas e grupos que tendo iniciativas e projetos que por em
marcha se encontram com numerosas dificuldades práticas.
Propomos por isso
a consolidação da rede de experiências neste sentido já
existente, a elaboração a partir das experiências de uma
guia para a instalação de projetos agro-ecológicos
produtivos que incluam informação sobre formas de
financiamento e comercialização alternativas ou acesso aos
meios. Estudar a possibilidade da
criação de um Banco de
Terras para a implantação de novos projetos
e elaborar de forma clara uma estratégia de resistência
específica para os espaços da periferia através da
recuperação de terra produtiva.
7.
A crise fundamental do meio rural é a derivada do
DESPOVOAMENTO. É necessário
LUTAR CONTRA ESTE
DESPOVOAMENTO, e contra a desídia e a falta
de iniciativa das autoridades regionais, nacionais e
comunitárias. O futuro do mundo rural nos o jogamos nesta
partida. Consideramos que em muitos de nossos povos a
alternativa passa pela instalação de novos povoadores. Para
que este processo se desenvolva em condições, as pessoas e
famílias com inquietude pelo meio rural têm que ter
possibilidade de um acompanhamento e assessoramento que lhes
facilite a participação em encontros e foros onde poder
contrastar com as pessoas do campo sobre das dificuldades,
aspirações ou desejos de ambos. É necessário compartir
experiências de re-povoamento que permitam elevar propostas
econômicas e políticas que forcem as autoridades públicas a
abordar a questão sem renunciar as nossas lutas concretas.
8.
Somos testemunhas de um processo de mercado sem precedentes
dos recursos da
TERRA E ÁGUA O acesso a estes meios é
fundamental para o desenvolvimento de experiências
significativas de povoamento e produção no meio rural. Água
e Terra devem ser bens comuns o que implica o acesso
universal que deve estar garantido. É necessário avançar e
aprofundar os conceitos anteriores se quisermos enfrentar de
forma clara o modelo existente. É necessário reavaliar os
bens comuns ou as experiências de propriedade, gestão ou uso
comunal ainda existente em muitas zonas rural do estado.
É necessário
gerar alianças entre os vizinhos destes municípios com os
movimentos ecologistas para lutar contra o processo
especulativo que os habitantes do meio rural observamos ns
últimos anos; a apropriação pelo estado de bens comunais
para a nova qualificação dos usos, o falso desenvolvimento
rural que esconde projetos imobiliários de grande impacto,
as grandes infraestruturas hidrográficas que servem para
financiar modelos insustentáveis de produção agrária ou para
projetos turísticos em zonas litorais. Em contra de tudo
isto seria necessário à geração de experiências de bancos de
terra que favoreçam usos diferentes e que facilitem o acesso
a jovens agricultores, divulgar modelos de gestão de água
autônomos, descentralizados e sustentáveis onde a
democratização da gestão e o uso seja um valor que facilite
a conscientização das pessoas do mundo rural respeito dos
recursos. Fazemos um chamado à Plataforma Rural a converter-se
em ponto de encontro que facilite e potencie este
intercâmbio de experiências e projetos.
9.
Assistimos a um processo de precariedade crescente
DAS RELAÇÕES TRABALHISTAS NO
CAMPO. Somos conscientes de que enquanto o
modelo agrário siga o caminho do "produtivismo", a
industrialização e a capitalização crescente das explorações,
o TEMPORERISMO E A
EVENTUALIDADE ABSOLUTA serão a forma de
trabalho assalariado estrutural no campo. Para que as
relações trabalhistas no campo mudem é necessário avançar
para outro modelo agrário familiar e sustentável social e
ecologicamente que remunere o trabalho de todos e todas.
Frente ao discurso dominante das autoridades, consideramos
que a temporalidade agrícola não é uma alternativa de vida
digna para ninguém. Consideramos inumano e irresponsável
socialmente o impulsionar os centos de milhares de
trabalhadores imigrantes a esta saída como a melhor forma de
integração em nossa sociedade. Enquanto que a mudança de
modelo agrário se produz é necessário trabalhar pela
dignidade das condições de trabalho existentes melhorando a
legislação trabalhista e garantindo seu cumprimento ainda
sabendo de que não é o caminho de solução. Neste contexto e
conhecendo as pessoas que temos participando na oficina a
realidade da qual falamos consideramos necessário à
necessidade de que os e as trabalhadoras temporários se
organizem sindical e socialmente para reivindicar seus
direitos. Somos conscientes pela realidade existente que as
organizações sociais podem apoiar neste processo de
organização sem substituir a voz dos afetados. Propomos
ativar de novo o espaço de diálogo dentro da Plataforma
Rural entre os sindicatos de trabalhadores, organizações
agrárias e organizações sociais interessadas no tema.
10.
Avançamos na construção de uma proposta de
CIRCUITOS CURTOS DE
COMERCIALIZAÇÃO nos que produção,
distribuição e consumo são funções situadas no mesmo nível
social e econômico, e onde as condições do processo
econômico se definem com a participação e a capacidade de
decisão de todas e todos os atores. A comercialização não é
a que define a relação, senão uma distribuição da produção
que assegura as necessidades de todas as pessoas que se
implicam no processo. Consideramos que é necessário fazer
uma primeira aposta pelo comércio local e regional de forma
que encurtemos os ciclos de comercialização num primeiro
momento de desenvolvimento d idéia. Posteriormente e geradas
estas condições é possível avançar para outras experiências
locais de diálogo entre produção e consumo fortalecendo as
alianças análogas à plataforma rural no local, fomentar os
mercados locais de produtos locais, coordenar as
experiências locais e fomentar redes de distribuição a
diferente escala. Somos conscientes que o marco jurídico
institucional dificulta desde as questões mais simples do
mercado local até as mais complexas, a arrancada deste
modelo. Há que pressionar nos diferentes âmbitos de
competência; prefeituras, comunidades autônomas ou
ministérios para abrir pequenas brechas onde as iniciativas
possam localizar-se e desenvolver-se.
11.
O modelo agrário dominante necessita da biotecnologia para
desenvolver-se. Os
CULTIVOS TRANSGÊNICOS constituem hoje uma
ameaça para o desenvolvimento de outro modelo diferente.
Desde Plataforma Rural a gente vem desenvolvendo um trabalho
de pressão política e mobilização social contra os
transgênicos que nos últimos anos tem aumentado devido ao
total desprezo do governo anterior para a sensibilidade de
agricultores, consumidores e organizações sociais. Nestes
próximos meses será necessário continuar divulgando a
legislação existente para uma aplicação transparente e
correta da mesma no estado espanhol. Será necessário
levantar os casos de contaminação transgênica e de
resistências diversas geradas por estes cultivos de forma
que possam elevar-se às instâncias pertinentes e demonstrem
a necessidade da proibição. São fundamentais a formação e
informação gerada entre os agricultores respeito a estes
cultivos e é necessário conhecer onde estão os campos de
cultivo comercial e experimental existentes na Espanha.
Segue sendo necessária a ação direta neste tema como forma
de reclamo público. Propomos continuar com a experiência já
iniciada de criação de zonas livres de transgênicos em nível
local ou autônomo.
12.
Desde Plataforma Rural queremos de novo reconhecer o papel
transcendental da população rural que tem permitido a
conservação de grande quantidade de saberes que constituem a
base das culturas locais. Consideramos um bem comum esta
bagagem e consideramos um dever valoriza-lo e conserva-lo
para apreender dele. O objetivo é recuperar, sistematizar,
valorar e transmitir este conjunto de conhecimentos e
saberes camponeses. Continuamos em nosso esforço de por em
marcha uma Universidade Rural que reconheça simplesmente
estes saberes que hoje se perdem . O projeto está em marcha
e nele nos integramos 22 grupos locais. Para o
desenvolvimento do mesmo estamos fortalecendo as associações
no território, a constituição da associação estatal e a
aliança com experiências semelhantes no resto da Europa. Nos
próximos meses nos esforçaremos em por em marcha o projeto
de cooperação interterritorial.
13.
O patrimônio genético que constituem as sementes e a
diversidade cultural associada às variedades locais segue
sofrendo uma perda aumentada pelo esquecimento e favorecida
pelas grandes empresas dedicadas a sua produção industrial.
O conhecimento associado a nossos agricultores maiores se
perde pouco a pouco. As leis de patentes atacam o direito do
agricultor de produzir e intercambiar suas variedades e aos
bancos de germoplasma que deveriam conservar estas
variedades são totalmente abandonados. Frente a isto desde
Plataforma Rural favorecemos o desenvolvimento de una
REDE DE SEMENTES que se preocupasse pela manutenção,
conservação e reprodução de esta biodiversidade existente.
Neste momento sentimos a necessidade de fortalecer este
vínculo e consolidar a rede como instrumento de pressão.
Para que este processo se consolide vemos necessário em um
primeiro lugar centralizar e compartir depois toda a
informação sobre os diferentes projetos e grupos locais.
Estabelecer uma estratégia de luta política frente ao
tramado legal e institucional que impede o desenvolvimento
da reprodução, intercâmbio, multiplicação de variedades
locai assim como seu registro. A luta contra os direitos de
propriedade intelectual que impedem o acesso aos recursos
filogenéticos e um trabalho com o agricultor e agricultora
sobre tudo das zonas mais isoladas onde ainda se conservam
variedades autóctones. Consideramos fundamental estabelecer
nexos com os investigadores interessados neste campo.
Sem mais e sendo esta nossa convicção damos por
concluído o IV Foro
por um Meio Rural Vivo. Em El Escorial em 21
de Março de 2004.
GLOBALIZEMOS A LUTA, GLOBALIZEMOS A ESPERANÇA!!
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