Comissão autoriza plantio comercial de terceira variedade de
milho transgênico desde que quorum para decisões foi
reduzido. Organizações socioambientalistas tentam impedir
liberação, como nos casos dos milhos da Bayer e da Monsanto.
Batalha dos transgênicos recrudesce em setembro
A batalha política e jurídica travada entre os setores da
sociedade que desejam a liberação facilitada dos
transgênicos no Brasil e aqueles que defendem o
princípio da precaução e alertam para os possíveis riscos
que esses alimentos podem trazer à saúde humana e ao meio
ambiente recrudesceu nesse mês de setembro. Vitórias
conquistadas de parte a parte, seja na Comissão Técnica
Nacional de Biossegurança (CTNBio) ou na Justiça,
demonstram que, apesar da insistência do poderoso setor de
biotecnologia em introduzir os transgênicos no Brasil,
essa polêmica ainda está longe de ser solucionada.
De um lado, a CTNBio deu novas provas de sua postura
pró-indústria dos transgênicos ao aprovar sem maiores
discussões o plantio comercial de mais uma variedade de
milho modificado, numa decisão que já está sendo contestada
judicialmente pelas organizações do movimento
socioambientalista reunidas na Campanha por um Brasil Livre
de Transgênicos.
De outro lado, a Justiça de São Paulo determinou que as duas
maiores fabricantes de óleo de soja do Brasil -
Bunge e Cargill - rotulem imediatamente seus
produtos (Soya e Liza) como transgênicos. Em meio ao fogo
cruzado, as entidades reunidas no Fórum Nacional pela
Reforma Agrária enviaram ao presidente Luiz Inácio Lula
da Silva uma carta questionando a liberação comercial do
milho transgênico no país.
Resistente a herbicidas e inseticidas, o milho transgênico
Bt11, desenvolvido pela empresa transnacional de origem
suíça Syngenta Seeds, teve seu plantio comercial
liberado pela CTNBio na reunião realizada em 20 de
setembro. Essa foi a terceira liberação de milho transgênico
feita pela comissão desde abril, quando o quorum mínimo
necessário à tomada de decisões dessa natureza foi reduzido
de dois terços para maioria simples, por decisão do
Congresso Nacional reiterada pelo presidente Luiz Inácio
Lula da Silva. Para liberar o milho da Syngenta,
foram necessários os votos de 15 membros da comissão, entre
os 27 presentes à reunião.
Os protestos dos demais membros da comissão e a presença de
dezenas de manifestantes com cartazes do lado de fora da
reunião não evitaram, mais uma vez, a postura facilitadora
da CTNBio. Em maio, a comissão já havia liberado o
milho Liberty Link, desenvolvido pela transnacional de
origem alemã Bayer CropScience. Em agosto, foi a vez
do milho transgênico desenvolvido pela transnacional de
origem norte-americana Monsanto ter seu plantio
comercial liberado. Ambas as liberações estão sendo
contestadas na Justiça, fato que vai se repetir em relação
ao milho Bt11 da Syngenta.
Assim que a CTNBio aprovou o Liberty Link, as
organizações Terra de Direitos, Associação Nacional de
Pequenos Agricultores, Instituto Brasileiro de Defesa do
Consumidor (Idec) e Assessoria e Serviços para
Projetos em Agricultura Alternativa (AS-PTA)
deram entrada em uma Ação Civil Pública contra a decisão da
comissão na Justiça Federal do Paraná. Em 28 de junho,
conseguiram uma liminar que suspendia a liberação do milho
da Bayer até que a comissão comprovasse a tomada de
medidas de segurança que garantissem a coexistência do
transgênico com as demais variedades de milho convencionais
ou orgânicas.
Outra exigência feita pela Justiça Federal é a elaboração,
pela CTNBio, de um plano de monitoramento do milho
transgênico em sua fase de pós-comercialização. A juíza
Pepita Mazini, que concedeu às organizações
socioambientalistas a liminar contra o Liberty Link,
estendeu sua decisão à quaisquer outras liberações, mesmo as
posteriores, envolvendo variedades de milho transgênico, o
que acabou englobando na ação civil os milhos da Monsanto
e, agora, da Syngenta.
A toque de
caixa
Apesar de a determinação da Justiça Federal do Paraná ter
acontecido antes da reunião ordinária de agosto, a CTNBio
decidiu liberar também os milhos da Monsanto e da
Syngenta. Para tanto, aprovou, sempre com maioria
simples, planos de garantia de coexistência para os milhos
transgênicos em geral e também para seu monitoramento
pós-comercial.
As organizações do movimento socioambientalista, no entanto,
afirmam que a comissão não elaborou esses planos de forma
correta: “Acreditamos que a CTNBio não respeitou o
que foi determinado pela liminar. Caberá agora à Justiça
verificar se os termos foram cumpridos. Se concluir que não
foram, como esperamos, as três variedades de milho
transgênico permanecerão proibidas”, avalia Gabriel
Fernandes, que é técnico em agronomia da AS-PTA e
dirigente da Campanha por um Brasil Livre de Transgênicos.
Os ministérios da Saúde, por intermédio da Agência Nacional
de Vigilância Sanitária (Anvisa), e do Meio Ambiente,
por intermédio do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), também
devem questionar a aprovação do milho Bt11. Ambos os órgãos
já haviam enviado ao Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS),
colegiado composto por onze ministérios, um pedido de
anulação da liberação do Liberty Link, ação que depois se
estendeu ao milho da Monsanto.
A expectativa dos que lutam contra a liberação
indiscriminada dos transgênicos, no entanto, é de que o
governo não vá tomar decisões políticas que possam ser mais
tarde contestadas judicialmente: “O CNBS não deve se
pronunciar sobre os questionamentos do Ibama e da Anvisa até
que a Justiça tome uma decisão”, aposta Fernandes.
Por outro lado, as empresas, segundo ele, têm muita pressa:
“Estão correndo contra o relógio, pois se não garantirem nas
próximas semanas a liberação, perderão a época de fazer a
multiplicação das sementes”.
Maurício Thuswohl
Carta Maior
27 de setembro de 2007
artículos relacionados