Planos com medidas de segurança para evitar a
contaminação do milho convencional e orgânico e
para monitorar o transgênico em sua fase de
pós-comercialização foram considerados
insatisfatórios pela Justiça Federal.
Organizações do movimento contra os transgênicos
comemoram decisão.
Órgão do governo federal responsável pela
liberação dos transgênicos no Brasil, a
Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio)
teve mais uma vez desautorizada pela Justiça uma
de suas tentativas de aprovar o plantio
comercial de algumas variedades de milho
transgênico produzidas por empresas
transnacionais como a
Bayer,
a
Monsanto
e a
Syngenta.
Por determinação da juíza federal Pepita
Mazini, da Vara Ambiental de Curitiba,
permanecem suspensas todas as deliberações da
CTNBio sobre esse tema até que a comissão
apresente de forma satisfatória respostas aos
questionamentos da Justiça acerca dos riscos
trazidos pelo milho transgênico à saúde humana e
ao meio ambiente.
As decisões da CTNBio sobre o milho
transgênico já haviam sido suspensas uma
primeira vez pela Justiça Federal em junho,
quando a mesma juíza determinou que a liberação
de qualquer plantio comercial pela comissão
estivesse condicionada à tomada prévia de
medidas de segurança que garantissem a
coexistência dos novos produtos com as demais
variedades de milho convencionais ou orgânicas
existentes no país. Outra exigência foi a
elaboração de um plano de monitoramento do milho
transgênico em sua fase de pós-comercialização.
Em sua última reunião, realizada em setembro, a
CTNBio aprovou, por maioria simples, os
dois planos exigidos pela Justiça, mas esta
semana a elaboração de ambos foi considerada
insatisfatória pela juíza, que determinou à
comissão que os refizesse. Na avaliação de
Pepita Mazini, os planos não
atenderam ao princípio da precaução e sua
elaboração não levou em conta o que está
estabelecido na Lei de Biossegurança promulgada
em 2005.
Essa decisão suspende a liberação para plantio
comercial das três variedades de milho
transgênico aprovadas pela CTNBio desde
maio. São elas o milho Liberty Link,
desenvolvido pela
Bayer,
o milho MON 810, desenvolvido pela
Monsanto,
e o milho Bt11, desenvolvido pela
Syngenta.
Há anos aguardando para serem votados pela
CTNBio, os pedidos de liberação das três
empresas transnacionais só puderam ser aprovados
depois que, por decisão do Congresso Nacional
reiterada em abril pelo presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, o quorum mínimo para
decisões desse tipo na comissão foi reduzido de
dois terços para maioria simples.
Justiça aponta falhas
A Justiça apontou algumas falhas observadas nos
planos elaborados pela CTNBio. Na
Resolução Normativa 3, que trata do plano de
monitoramento para a fase de pós-comercialização
do milho transgênico, a comissão delegou às
próprias empresas a tarefa de apresentar um
plano de monitoramento referente a sua espécie
transgênica aprovada. Essa delegação de poderes
desobedece ao artigo 14, III, da Lei de
Biossegurança, que imputa à própria CTNBio
a atribuição de planejar e realizar tal
monitoramento.
A Resolução Normativa 4, que deveria tratar da
coexistência de variedades de milho transgênicos,
convencionais, orgânicos e ecológicos, também
foi considerada pela Justiça como insatisfatória
e em desacordo com o princípio de precaução e a
Lei de Biossegurança. O plano elaborado pela
CTNBio se resumiu a estabelecer distâncias
mínimas de cem metros entre as áreas cultivadas
com milhos transgênicos e as áreas cultivadas
com milhos agroecológicos e convencionais. Essa
distância, segundo os agrônomos, é irrisória
para as culturas que, como o milho, são
polinizadas pelo vento.
Em seu despacho, a juíza reprovou a atitude da
CTNBio: “Não basta à comissão elaborar
referidas normas da forma como lhe aprouver, à
evidência, como forma de mera resposta ao
provimento judicial, mas sim com atenção ao
princípio da precaução e probabilidade de
futuros danos ambientais e à saúde humana. Sendo
assim, a decisão será considerada cumprida
apenas se elaboradas as normas de forma
pertinente, nos termos determinados pela Lei de
Biossegurança”, escreveu.
Risco de “contaminação massiva”
A decisão da Justiça foi bem recebida pelas
organizações que compõem a Campanha por um
Brasil Livre de Transgênicos: “Essa medida da
CTNBio iria promover uma contaminação
massiva do milho, acabando com a diversidade
genética que os agricultores familiares
conservam e também com o direito de consumirmos
alimentos livres de transgênicos”, afirma
Gabriel Fernandes, que é técnico em
agronomia da organização Assessoria e Serviços
para Projetos em Agricultura Alternativa (AS-PTA)
e um dos dirigentes da campanha.
Para a advogada Maria Rita Reis, da
organização Terra de Direitos, o acompanhamento
atento da Justiça é fundamental para que a
CTNBio não aprove grãos e alimentos
transgênicos sem levar em conta os reais
interesses da população brasileira: “Uma vez
mais, a CTNBio demonstrou total
descompromisso com a biossegurança e a sociedade
brasileira. A comissão se recusa a discutir
biossegurança, preocupando-se apenas com os
interesses das transnacionais de biotecnologia.
O problema da contaminação e o direito dos
agricultores cultivarem variedades
não-transgênicas têm que ser tratados com
seriedade”, diz.
Maurício Thuswohl
Carta Maior
17 de outubro de 2007