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A vida de um símbolo

da repressão

 

Manuel Juan Cordero, militar uruguaio acusado de torturar oposicionistas, vive como uma pessoa comum em Livramento

 

Um dos acusados de torturar oposicionistas de ditaduras na América do Sul, nos chamados Anos de Chumbo, vive como um cidadão comum e pacato em Santana do Livramento. Morando em uma casa no centro da cidade, o militar da reserva uruguaio Manuel Juan Cordero Piacentini, 70 anos, briga na Justiça para evitar a extradição para Argentina – autorizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) – sem, praticamente, chamar a atenção da população do município.

 

Cordero vive na Rua Uruguai, via que, por coincidência, leva o nome de seu país de origem. Na mesma casa mora o cunhado, Simão. O dinheiro que o sustenta no Rio Grande do Sul vem de sua aposentadoria de tenente-coronel do exército uruguaio – recebida em Montevidéu por sua filha, procuradora de Cordero.

 

Sua casa, de cor amarela, é discreta em meio a outras bonitas residências que a circundam. A pintura está gasta, e as janelas ficam sempre fechadas – a residência parece até abandonada. No portão da garagem, a tinta branca não conseguiu apagar por completo uma pichação que estampa a palavra “asesino” – “assassino”, em espanhol.

 

Achar alguém que fale de Cordero é difícil. Muitos utilizam a justificativa de que não o conhecem ou não acompanham sua vida. Outros, como vizinhos, preferem não fazer comentários.

 

Zero Hora tentou falar com Cordero. Na casa onde mora, nas proximidades da Estação Rodoviária de Livramento, demorou a atender a reportagem. Conversou brevemente através dos frisos da janela. Não era possível sequer ver o rosto do militar. Cordero disse que não poderia falar, por recomendação do advogado. Definiu essa atitude como “estratégia de defesa”, pois foi alvo de protestos na última semana – manifestantes se concentraram em frente à casa do militar, chamando-o de “assassino” e “torturador”.

 

Em suas raras saídas, vai até a um armazém próximo. Quando é visto, geralmente está trajando roupas simples. O dono do pequeno ponto comercial preferiu não se identificar, mas falou sobre o militar:

 

– Ele é quieto. Entra, compra e vai embora. Não é de conversar – contou.

Certa vez, Cordero foi visto tomando cerveja em um bar próximo à linha divisória entre Livramento e Rivera.

 

Um deboche à Justiça, diz ativista

 

O simples fato do militar uruguaio Manuel Cordero sair de casa, mesmo que raramente, infringe a prisão domiciliar a que está submetido. Conforme o presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Jair Krischke, o militar não deveria deixar a residência em hipótese alguma.

 

– Foi concedida a ele a prisão domiciliar com a justificativa de que estaria com problemas cardíacos e de que passaria por uma cirurgia. Até hoje se desconhece essa operação e ainda há esses relatos de que ele bebe e fuma. É um deboche à Justiça brasileira. Que cardíaco é esse? – questiona.

 

Krischke é a pedra no sapato de Cordero. Mesmo de Porto Alegre, o ativista não deixa de se manter informado sobre a vida do militar e de tomar medidas para que a extradição – autorizada em 6 de agosto deste ano – seja efetuada.

 

Cordero já declarou que, mesmo com a extradição para a Argentina definida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), vai manter sua defesa. O que ele alegará para não sair de Livramento é aguardado com ansiedade por Krischke e por Argentina e Uruguai, países de origem de vítimas que teriam sido torturadas e mortas na Operação Condor, entre as décadas de 70 e 80

Ronan Dannenberg

Zero Hora

2 de septiembre de 2009

 

 

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