Acidente de trabalho vira "suicídio"
CUT, CONTAC, UITA
e Sindicatos fazem manifestação
sábado contra os
crimes da Cargill em Sidrolândia-MS
Com o apoio da União Internacional dos Trabalhadores nas
Indústrias da Alimentação (UITA), a CONTAC e a
CUT realizarão manifestação neste sábado (21/7) em frente ao
frigorífico da Seara/Cargill de Sidrolândia, a 60
quilômetros de Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul. Com
a participação do secretário geral da CUT nacional,
Quintino Severo, o ato, marcado para as 14 horas, defenderá
a memória de Marcos Antonio Pedro, indígena morto em
acidente de trabalho, a quem a multinacional acusa de suicida
para não ter de pagar indenização à família.
Dirigente da UITA, Gerardo Iglesias está no
Brasil para fortalecer a mobilização:
"Além de não indenizar a
família, a empresa ainda vilipendia sua memória com essa
acusação absurda. É como se Marcos estivesse sendo morto
novamente. Estaremos juntos em Sidrolândia para exigir justiça",
informou o dirigente.
De acordo com Sérgio Bolzan, da executiva da Federação
dos Trabalhadores da Alimentação do Mato Grosso do Sul e
presidente do Sindaves de Sidrolândia, "não só a cidade,
mas todo o Estado está revoltado com a conduta da Cargill,
que ainda não respondeu a uma única denúncia sobre a morte de
Marcos e abandonou a família".
Para o presidente da CONTAC/CUT e do Instituto Nacional
de Saúde do Trabalhador (INST), Siderlei de Oliveira,
"a família necessita ser indenizada e a empresa punida de forma
exemplar. Esta multinacional norte-americana passou dos
limites". "A Seara/Cargill tem adotado uma política
anti-sindical, convertendo os trabalhadores em seus reféns e
escravos. Tem espalhado por meio da superexploração e da
intensidade do ritmo de trabalho, lesões e mutilações em todo o
país. É hora das autoridades se mobilizarem e darem um basta,
pois esta multinacional já foi longe demais", ressaltou.
Siderlei
defende que "diante de tantas e tão fartas demonstrações de
barbárie da Cargill, que já comprovamos e denunciamos no
Senado, na Câmara e nas Assembléias Legislativas, são
necessárias ações e fiscalizações mais rigorosas, envolvendo os
Ministérios do Trabalho, da Saúde e da Previdência numa
verdadeira força-tarefa para pôr fim a esses desmandos".
Histórico
Índio, 29 anos, Marcos morreu ao cair dentro do tanque de
resfriamento de frangos (chiller). Como não havia proteção, e a
higienização até então era feita com a máquina em movimento, o
trabalhador foi sugado pela espiral (caracol) que puxa as aves
para a água. "Quando os mecânicos chegaram, queriam cortar o
tanque e tirá-lo por baixo, mas, ao invés disso, o controle de
qualidade da empresa determinou que se invertesse o movimento de
rotação das espirais. Não deu certo e ele foi praticamente
cortado ao meio", lembra Clodoaldo Alves, vice-presidente
do Sindaves e auxiliar de inspeção geral da Seara/Cargill
no frigorífico de Sidrolândia. No momento em que as espirais
puxaram o trabalhador para baixo, Marcos foi fatiado
vivo, cortando nervos e a coluna: "Estive com a menina que
presenciou tudo, ouviu os gritos de socorro, foi terrível,
Marcos teve ainda a cabeça prensada".
Neste tempo, a família já deveria ter recebido o dinheiro do
seguro privado (cerca de 20 mil reais), cujo prazo de demora é
de um mês. Passaram-se mais de três. Além disso, a empresa já
deveria ter sido intimada judicialmente e penalizada a indenizar
monetariamente a família, já que houve um acidente fatal pelo
qual tem responsabilidade inquestionável. Nada disso ocorreu e a
mulher Edneuza Pereira, e as filhas Greice Kelly,
de 4 anos, e Kellijane, de 3, foram abandonadas pela
Cargill. Sem recursos, voltaram para a aldeia, abrigadas
pelos pais de Edneuza e um salário mínimo da Seguridade
Social.
Adulteração
Após a tragédia, informa Clodoaldo, "tudo foi
inteiramente modificado pela empresa na noite do acidente.
Diminuíram a altura das plataformas próximas ao chiller, pois
antes você batia a cabeça, tinha de andar curvado, ficando bem
na borda do tanque, sem a mínima segurança. Esse desnível
acentuado favoreceu a queda de Marcos. Também colocaram chapas
de proteção de inox em volta do chiller, um item de segurança
que nunca existiu. Além disso, agora a higienização está sendo
feita com a máquina desligada, colocaram sensores, baixaram a
tubulação para ler os hidrômetros que ficavam lá em cima perto
das bordas do pré-chiller e o local ficou completamente
isolado".
Conforme Sérgio Bolzan, "quando os fiscais do Ministério
do Trabalho chegaram para inspecionar já haviam sido feitas as
modificações de segurança na plataforma e na máquina".
"Versão da Cargill
é absurda e cruel"
Diretor da Escola Municipal Indígena Horta Barbosa, o professor
Edílson lembra do amor do irmão pelo futebol, que jogava
todos os finais de semana com os amigos em Sidrolândia, onde há
uma aldeia dentro da cidade. "Marcos era torcedor do São Paulo e
gostava de jogar de centroavante. Vivia alegre com a esposa e as
filhas. Tinha ido para a cidade pois planejava um bom futuro
para as crianças. Isso de falarem em suicídio é um absurdo,
muito cruel", relatou Edílson.
Bolzan
ressalta que "nada vindo da Seara/Cargill surpreende,
pois se a empresa demite por justa causa trabalhadores que ela
própria inutilizou e manda embora funcionários às vésperas de se
operarem, insistindo na subnotificação de acidentes de trabalho
para não ter de pagar por lesões e mutilações, o que dizer num
caso como esse, onde terá de pagar uma enorme indenização à
família?".
Leonardo Wexell Severo
CONTAC/CUT
20 de julho de 2007
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