"Multinacionais especulam com a fome
e
atentam contra soberania alimentar" |
"É preciso que o
Estado intervenha para garantir a produção nacional
de alimentos por meio de uma política de preços
mínimos, de estoque regulador, com a construção de
silos e investimentos na produção nacional de adubos
e fertilizantes", afirmou Siderlei
"Ao
especularem com a fome, as multinacionais atentam
contra a soberania alimentar dos nossos países, se
convertendo numa verdadeira ameaça. Para ampliarem
seus já formidáveis lucros, atuam de todas as
formas, apoderando-se da planta, da terra, das
sementes, dos grãos, dominando todo o processo de
produção. Assim, não existe um mercado propriamente
dito, pois aniquilam a concorrência e acaba se
comercializando o que elas determinam. E o que é
ainda mais grave: são essas grandes empresas
estrangeiras que acabam impondo se o alimento
produzido será para o homem, para o animal, ou
simplesmente se aquele grão vai virar combustível,
como é o caso do milho nos EUA".
A
afirmação é de Siderlei de Oliveira,
presidente da Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Alimentação (CONTAC/CUT) e
do Instituto Nacional de Saúde do Trabalhador (INST),
denunciando a ação de transnacionais "como a
Cargill
e a Bunge, que fazem do alimento, que é a energia do homem, uma
forma de aumentarem o seu poder econômico, ampliando
seus lucros com a fome de milhões de pessoas em todo
o mundo".
Na
avaliação do presidente da CONTAC, "é preciso
que o Estado intervenha para disciplinar, coibir
abusos. No caso brasileiro, para garantir a produção
nacional de alimentos por meio de uma política de
preços mínimos, de estoque regulador, com a
construção de silos e investimentos na produção de
adubos e fertilizantes, hoje na quase totalidade em
mãos estrangeiras". "O mundo está de olho no
Brasil, porque temos uma grande quantidade de
terras e potencialidade para abastecer o planeta.
Por isso, na questão dos biocombustíveis, o Estado
precisa intervir, não pode deixar que fuja do
controle, porque as multinacionais não respeitam
nada além da lei do lucro", acrescentou.
Além de ampliar os investimentos na agricultura
familiar, responsável por mais de 70% da produção de
alimentos para o mercado interno, ressaltou
Siderlei, o governo federal precisa fomentar a
criação de complexos agroindustriais vinculados à
cooperativas de produtores. Desta forma, frisou, "em
vez de vender para a multinacional sua matéria-prima,
o produtor poderá agregar valor, para si, para sua
comunidade e o país. E isso vale não só para os
produtos agrícolas. Na área frigorífica, por exemplo,
com embutidos, poderemos garantir empregos de
qualidade e com maior independência na
comercialização".
Entre os inúmeros e trágicos exemplos de conduta
criminosa das multinacionais, Siderlei citou
o caso da norte-americana
Cargill. "Estivemos recentemente no encontro mundial da carne, na
Inglaterra, onde as ações anti-sindicais da
Cargill
voltaram ao centro dos debates. O trato da empresa
com os funcionários é o pior possível, uma política
muito ruim, uma agressão que é corriqueira e não só
no Brasil. Na Tailândia, obriga os
trabalhadores a encararem jornadas de até 15 horas,
multiplicando as doenças relacionadas ao trabalho,
as lesões e mutilações. Proibindo os empregados até
mesmo de ir no banheiro, são inúmeras as denúncias
sobre cistites e graves infecções no aparelho
urinário", declarou Siderlei de Oliveira.
A
fim de "coibir o verdadeiro flagelo que são os
frigoríficos da
Cargill",
propõe Siderlei, "é necessário
responsabilizar criminalmente quem brinca com a
saúde do trabalhador, reduzir a intensidade do ritmo
de trabalho e a carga horária, ampliar a
fiscalização e o valor das multas".
Em
todo o Brasil, as denúncias contra esta
multinacional se multiplicam. "Quem não lembra do
caso de Valdirene João Gonçalves da Silva,
funcionária da
Seara/Cargill em Forquilhinha, no interior catarinense, durante 11 anos e
inválida aos 35 anos, chantageada pela direção da
empresa para não tornar público o diagnóstico médico
de que seu braço estava podre? Após inúmeras
mobilizações e intensa pressão do Sindicato e da
CONTAC, conseguimos que a empresa admitisse a
culpa. Valdirene foi então submetida a uma
operação no cérebro, mas infelizmente não houve
reversão do quadro".
Siderlei
lembrou que em Jaraguá do Sul-SC, a Justiça obrigou
a Cargill a retirar lonas e capangas da unidade, onde submeteu
trabalhadores à cárcere privado durante uma greve.
No mesmo local, uma operária foi demitida um dia
antes da cirurgia de retirada de útero, previamente
agendada.
Em
Sidrolândia, no interior do Mato Grosso do Sul, uma
vítima fatal: Marcos Antonio Pedro,
funcionário do setor de higienização e limpeza da
Seara/Cargill. Índio, 29 anos, pai de três filhos, Marcos morreu
quando caiu dentro do tanque de resfriamento de
frangos (chiller), ao escorregar enquanto fazia uma
limpeza de resíduos. Como não havia proteção, e a
higienização até então era feita com a máquina em
movimento, o operário foi sugado pela espiral
(caracol) que puxa as aves para a água. "Quando os
mecânicos chegaram, queriam cortar o tanque e tirá-lo
por baixo, mas, ao invés disso, o controle de
qualidade da empresa determinou que se invertesse o
movimento de rotação das espirais. Não deu certo e
ele foi praticamente cortado ao meio, nos contou o
auxiliar de inspeção geral", recorda Siderlei.
Buscando ficar impune, a multinacional alegou que o
operário havia se suicidado e adulterou o local do
crime. "Os trabalhadores denunciaram que a
Cargill diminuiu a altura das plataformas próximas ao chiller e que
esse desnível acentuado favoreceu a queda de Marcos.
Também pôs chapas de proteção de inox em volta do
chiller, um item de segurança que nunca existiu".
"Vamos deixar na mão desse tipo de gente fazer a
opção pelo homem ou pelo lucro?", questionou
Siderlei
CUT/Rel-UITA
11
de julho de 2008