Coca Cola ao SPA

Mudar para não seguir perdendo

Aos 119 anos de vida a emblemática transnacional estadunidense aparece lenta na hora de realizar mudanças e confusa para definir sua estratégia. PepsiCo está perto de destronar a rainha que ainda tenta saber se está doente de burocracia ou se está acabando “a fagulha da vida”.

 

Coca Cola, a Black e a geração de emprego

 

O 15 de janeiro Coca Cola realizará o lançamento da nova bebida com extratos de café. Dirigida ao público adulto, a “Cola com café” –como já a denominam- contem 20 calorias por 100 mililitros, a metade que uma Coca Cola normal. Desta forma a transnacional aposta na tendência do aumento no consumo de café e na demanda também crescente do mercado de bebidas de baixas calorias. Com a apresentação deste novo produto -“tonificante, estimulante e ligeiramente carbonatado”- Coca Cola competirá com sua arqui-rival que apresentou faz várias semanas uma bebida análoga chamada PepsiMax Capuccino.

 

É fácil adivinhar que ambas transnacionais inaugurarão em breve uma nova batalha, esgrimindo um produto cuja idéia original não lhes pertence. Foi o grupo português Ness World que em 1995 lançou pela primeira vez no mundo um refrigerante de cola e café chamado Coffee Mix. Este produto se elaborou em Astúrias, Espanha, para o mercado internacional, mas como conseqüência do escasso apoio publicitário e o déficit na distribuição o empreendimento não prosperou.  

 

Graças à globalização e pressionada pelas baixas vendas na Europa Ocidental (na França perde mercado desde 2003), Coca Cola lançará por primeira vez um novo produto fora dos Estados Unidos. França tem sido o país escolhido e a nova bebida será produzida na Espanha, precisamente em La Coruña. Desde a sede central em Atlanta se afirma que o lançamento será tão importante como o da Coca Cola Light em 1998. 

 

Com certeza, no melhor estilo hollywodiano, a estréia da Black estará acompanhada com muita pirotecnia e insistentes pautas comerciais, mas poucos sabem que Coca Cola prevê fechar duas de suas fábricas francesas e menos que na fábrica galega selecionada para a elaboração do novíssimo produto –que se venderá primeiro na França e depois em outros países europeus- trabalham somente 360 pessoas.

 

Coca Cola pode perder seu reinado

 

Roberto Goizueta foi presidente da companhia por 16 anos, cargo que assume em 1980. Durante sua liderança Coca Cola mudou sua estratégia concentrando-se mais nos canais de distribuição e pontos de vendas que nos meios massivos. O produto estava por todos lados ao mesmo tempo: nas universidades, estações de metrô, aeroportos, museus, centros de reunião, etc.1  Uma frase sintetiza aquela estratégia: “Pepsi?, desculpe, só temos Coca”.

Em 1997 falece Goizueta, e Coca Cola ingressa em um período de grande instabilidade gerencial: nos seguintes oito anos passaram três presidentes.

 

As coisas já não andavam nada bem quando em junho de 2004 Neville Isdell, de 62 anos e 35 na companhia, abandonou seu ócio de aposentado y voltou para dançar com a mais feia: assumir como presidente do conselho e diretor geral da Coca Cola. Depois de três meses e meio de silêncio auto-imposto desde sua assunção, Isdell advertiu que não existia um remédio imediato para evitar o deterioro da empresa. “Coca Cola necessita ações corretivas com grande urgência. O importante é que a empresa passe à ofensiva, preveja as necessidades dos consumidores e atue com claridade”, manifestou o alto executivo em conferência de prensa.

 

Depois de 19 meses de sua nomeação, alguns importantes acionistas estão um pouco nervosos. “Neville (Isdell) é coerente naquilo que diz, mas eu gostaria de vê-lo descrever programas específicos em vez de limitar-se a expressar boas intenções. Já é tempo de prestar boas contas”, comentou Allen Adler, administrador de fundos de Nova Cork, a que possui ações da Coca Cola.2

 

A tendência à queda nas vendas da Coca Cola continua manifestando-se em mercados estratégicos como Europa Ocidental, Filipinas e Índia. Ainda que as mesmas ainda superam às de Pepsi em uma proporção de 2 por 1, nos últimos cinco anos as vendas de PepsiCo subiram 7,8% contra um 2,4%, que registrou Coca Cola. Logicamente, isso tem incidência no valor das ações e das companhias no mercado da bolsa. Enquanto que as ações de PepsiCo aumentaram, desde a re-contratação de Isdell as Coca Cola diminuíram 17%. O ano passado as ações de Coca Cola subiram tão somente 2,2%,  e seu valor no mercado chega a 101 bilhões e 200 milhões de dólares. Por sua parte, as ações de PepsiCo no mesmo período, subiram 14% e a empresa vale agora 99 bilhões e 100 milhões de dólares.3 A diferença no valor de ambas transnacionais é de 2 bilhões e 100 milhões de dólares. Faz uma década, no cálculo mais otimista para ela PepsiCo valia menos da metade que Coca Cola.4

 

Um lifting para Coca Cola

 

Neville Isdell admitiu que os problemas que enfrenta a companhia se devem a que seus antecessores, Douglas Daft e M. Douglas Ivester, reduziram o orçamento de mercadotecnia com o fim de incrementar os lucros em curto prazo, e a que Coca Cola reagiu com lentidão ante o crescimento da popularidade das bebidas não carbonatadas.5 É por isso que para recuperar o terreno perdido frente à sua acérrima competidora e o crescente mercado de sucos, águas e bebidas energéticas, Coca Cola lançará em 2006 uma campanha de publicidade e marketing a cargo da agência Wieden & Kennedy, que adquirira notoriedade por suas campanhas para Nike e pelo seu slogan “Just do it”. Para a transnacional de Atlanta, o slogan será: “Bem-vindo ao lado Coca Cola da vida”.

 

Assim, aos 2 bilhões de dólares gastados em 2004 em publicidade e marketing se somaram em 2005 mais uns 400 milhões. Dois bilhões e quatrocentos milhões de dólares! A cifra é tão astronômica que faz perder toda perspectiva. Ainda que vale a pena dizer que, por exemplo, com 2 bilhões e 400 milhões de dólares se podem adquirir instalações para o abastecimento de água potável e saneamento a baixo custo para 48 milhões de pessoas; podia-se erradicar a tuberculose e a malária, alimentar durante um mês a 53 milhões de crianças ou proporcionar educação fundamental para 14 milhões de crianças que não estão alfabetizadas.

 

A infidelidade do consumidor

 

Coca Cola e PepsiCo controlam as três quartas partes do mercado de bebidas, que move 66 bilhões de dólares anuais. Na década dos 90, a venda de gasosas crescia nos Estados Unidos entre um 3 e um 4% ao ano. Nesta década o crescimento do segmento de bebidas carbonatadas no citado país se mantém em menos do 1%, e a participação de mercado deste tipo de bebidas tem descido do 83% em 1999 para um 73%. O panorama de vendas de bebidas não carbonatadas, excluindo a água engarrafada, subiu 8% somente em 2004.6

 

Em maio do ano passado a empresa Morgan Stanley realizou uma sondagem cujos resultados assinalaram que o 52% dos jovens entre 18 e 24 anos manifestou estar consumindo menos refrigerantes ou que os consomem muito ocasionalmente, enquanto que o 48% diz que bebe mais água.

 

Coca Cola segue sendo a empresa que mais refrigerantes vende no mundo. Por sua parte, a base de crescimento de PepsiCo é sua diversificação, já que menos do 20% de seu faturamento provem das bebidas sem álcool, porcentagem que no caso de Coca Cola supera o 80%. Alem de vender água engarrafada quatro anos antes que sua competidora, PepsiCo tem se diversificado para o setor de alimentos e adquiriu marcas fortes como Frito-Lay, líder absoluto no segmento snacks empacotados (PepsiCo obtém desta empresa mais da metade de seus lucros), Gatorade (com o 80% do mercado de bebidas energéticas nos EEUU) e os sucos Tropicana.

 

Neville Isdell tem descartado realizar uma grande aquisição que diversificaria a Coca Cola para o rubro alimentício. A nova campanha publicitária e o lançamento de novas bebidas serão suficientes para re colocá-la no mercado? 

 

A imagem é tudo

 

A contratação da agência Wieden & Kennedy se soma às mudanças acontecidas na área de marketing e publicidade concretizados com a assunção de Mary Minnick em maio de 2005, designada como agente de mudança na companhia. Ela supervisa a coordenação de comercialização, inovação e crescimento estratégico e responde diretamente a Neville Isdell.

 

Minnick leva 23 anos trabalhando em Coca Cola e antes de ocupar a nova divisão de estratégia para desenvolver e promover novos produtos, se desempenhou como presidenta da companhia na Ásia desde início de 2001. Á frente de sua nova responsabilidade, e através da campanha publicitária, ela quer conseguir que os consumidores considerem a marca como a única e insubstituível opção de bebida. A campanha estará dirigida fundamentalmente aos jovens, e para isso se começará a praticar um agressivo programa de fidelidade distribuindo-se 4 bilhões de códigos em pacotes para que os consumidores colecionem e ganhem prêmios.

 Alem do lançamento de Black o próximo domingo, este ano se realizará também o lançamento de Coca-Zero na Austrália, que se anuncia será o maior da história.

 

Na sua analise sobre o grupo diretor de Coca Cola, o jornalista de “The Wall Street Journal”, Nikhil Deogun7, assinala: “É uma junta integrada por estrelas dos negócios, mas a indústria dos refrigerantes se parece cada vez mais com a moda a da moda, onde aparecem novas tendências e gostos”. Surpreendentemente, a idade média da junta diretiva atual de Coca Cola é de 66 anos.

 

Por último, e para seguir falando da imagem, o número de fábricas de Coca Cola onde atuam sindicatos é bem superior ao que mostra PepsiCo, que na verdade pode ser qualificada como una companhia anti-sindical. Isto fala bem de Coca Cola, contudo, nos últimos anos a situação na América Latina está mudando. Parece que em matéria de liberdades e direitos sindicais a companhia pretende emular a sua competidora. Na Guatemala, na Nicarágua e na Colômbia os sindicatos estão travando duras batalhas. Espera-se que ao novo slogan, “Bem-vindo ao lado Coca Cola da vida…”, não tenha que se somar… "um lado sem sindicatos”.

 

Gerardo Iglesias

© Rel-UITA

13 de janeiro de 2006

 

NOTAS:

1-Luta de Titãs. Horacio Marchand

2-Coca poderia ser destronada por Pepsi. Chad Terhune (06.12.05)

3-Coca quer voltar a ser única e insubstituível. El Observador, Montevidéu (18.12.05)

4-Coca poderia ser destronada por Pepsi. Chad Terhune (06.12.05)

5-Idem

6-Idem

7-Na guerra das colas, o último round é de Pepsi. (04.01.06)

 

  

 

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