O presidente Luiz Inácio Lula da Silva
chegou neste domingo a Genebra, na
Suíça, onde falará diante do Conselho de
Direitos Humanos da ONU, ocasião inédita
em seus sete anos de governo.
O discurso na manhã desta segunda-feira
será o primeiro item público da agenda
de Lula, que também participa em
Genebra da conferência da OIT
(Organização Internacional do Trabalho)
e de um almoço privado com o presidente
da França, Nicolas Sarkozy.
Voz ativa no órgão, o Brasil
recentemente se absteve de fazer
oposição a duas resoluções consideradas
fracas pelas organizações, uma sobre a
situação no Sri Lanka e outra
sobre a Coreia do Norte.
O Brasil afirma que tem
trabalhado por uma posição de consenso e
por trazer esses países para dentro do
Conselho, argumentando que isolamento
não resultaria em benefícios.
"O Brasil não tem de ficar
distribuindo certificados de bom
comportamento ou de mau comportamento
pelo mundo afora. Não é essa a tradição
da política externa brasileira", disse,
na chegada a Genebra, o assessor
especial do presidente Lula,
Marco Aurélio Garcia.
"Nós achamos que é muito mais importante
uma ação de caráter positivo, que
conduza o país a uma melhoria da
situação interna, que uma ação de
caráter restritivo. Os bloqueios, as
sanções internacionais, em geral elas
têm um efeito contrário: provocam de uma
certa forma um retraimento defensivo
muito forte, estímulo ao patriotismo e
coisas desse tipo."
Críticas
Entretanto,
organizações de direitos humanos
aproveitaram a visita de Lula para
questionar essa posição.
A diretora da
Human
Rights Watch em Genebra,
Julie de Rivero, criticou o
Brasil por
colocar o princípio da não ingerência em
assuntos domésticos antes dos direitos
humanos.
"Um dos limites à soberania são
justamente as violações de direitos
humanos", afirmou à BBC Brasil. "O
Brasil alega solidariedade, mas essa
solidariedade acaba sendo com governos
que cometem abusos contra os direitos
humanos, e não com as vítimas desses
abusos."
Mais incisivo é o texto que a
ONG
brasileira Conectas
preparou para ser distribuído também na
segunda-feira. Nele, a organização
sugere que o
Brasil
usa equivocadamente o Conselho como um
órgão para "redefinir a geopolítica
mundial".
A diretora internacional da ONG,
Lúcia Nader, disse à BBC Brasil que,
no afã de promover as relações sul-sul,
o
país
acaba fechando com resoluções brandas
porque são um meio termo entre textos
mais incisivos propostos pela União
Europeia e os Estados Unidos, e textos
insípidos levados adiante por aliados
regionais dos países em questão.
Para a ONG, esse foi o caso do texto do
Sri Lanka, "que não reconhecia
explícita e diretamente as violações
ocorridas, não tratava das obrigações do
governo cingalês nem previa mecanismos
de acompanhamento pelo Conselho de
Direitos Humanos".
A declaração foi defendida pelo governo
brasileiro como saída possível a fim de
permitir o diálogo com o governo do
Sri Lanka. A postura do país foi
qualificada de "pró-ativa" pelo
presidente do Conselho, o embaixador
nigeriano Martin Uhomoibhi.
O próximo voto do Brasil
observado pelas ONGs é o que se refere à
extensão do mandato do relator especial
da ONU para o Sudão, nesta
semana.
A Anistia Internacional afirmou que
"reconhece o potencial benefício do
papel mediador que o Brasil
deseja desempenhar entre regiões e
grupos de Estados no Conselho", mas
disse que "isto
não pode vir às custas de tomar posições
firmes em favor da proteção dos direitos
humanos, particularmente em situação de
graves e sistemáticas violações".
Polêmica sobre
assassinatos
Reforçando os receios das ONGs em
relação ao Brasil está a recente
polêmica envolvendo o relator especial
da ONU para execuções extrajudiciais,
Philip Alston, que criticou o país
em seu relatório sobre violência
policial após visitar o Brasil em 2007.
Na semana passada, questionado por um
jornalista durante uma entrevista
coletiva, o relator disse que poderia
haver inconsistências nas estatísticas
oficiais que mostravam uma redução no
número de homicídios do país. Alston
foi qualificado de "irresponsável" e
"preconceituoso" pela missão brasileira
em Genebra durante uma sessão do
Conselho.
A polêmica levou organizações de
direitos humanos a alertarem para um
possível enfraquecimento dos poderes
concedidos aos relatores especiais
--especialistas independentes que detêm
mandatos específicos para investigar,
acompanhar e recomendar soluções em
temas de direitos humanos
internacionais.
Mas apesar das polêmicas, a expectativa
em Genebra é para um discurso de Lula
centrado mais nos princípios de direitos
humanos de seu governo que no exercício
deles.
No fim da tarde, o presidente segue para
Ecaterimburgo, na Rússia, onde se
participa da primeira cúpula
presidencial dos países que formam o
grupo Bric (Brasil,
Rússia, Índia e China).
Pablo Uchoa
BBC Brasil
16 de junho de 2009