VIOLÊNCIA
| DESMATAMENTO
Governo do Pará trabalha
a favor de empresas
que destroem o meio ambiente, diz jornalista
“O governo do Estado
do Pará trabalha a favor das empresas que destroem o meio ambiente. Eu não tenho
nenhuma dúvida em afirmar isso”. A denúncia é do jornalista Marques Casara, que
coordenou o estudo “O aço da devastação”, financiado pelo Instituto Observatório
Social, uma instituição financiada pela CUT e pelas centrais sindicais FNV, da
Holanda e DGB, da Alemanha.
Casara
esteve em Nova Ipixuna em março, antes da morte dos ambientalistas. Diz que não
chegou a conversar com Zé Cláudio, mas admite que as palestras do
ambientalista que estão disponíveis na internet o inspiraram a ir para a região.
Casara descreve a Secretaria de Meio Ambiente do Pará como um lugar
totalmente tomado pela corrupção.
-Vocês fizeram um primeiro estudo em 2004. Como começou esse trabalho?
-A
coisa toda começou em 2004, quando eu fiz o primeiro trabalho lá para o
Observatório, que é tentar estudar um pouco a cadeia produtiva do carvão, ou
seja da onde vem o carvão e para onde vai o carvão.
A
gente conseguiu algumas provas documentais que mostravam
que as siderúrgicas de
ferro-gusa instaladas na Amazônia, no Polo de Carajás, estavam usando carvão do
trabalho escravo.
Trabalho escravo era o quê?
Eram
carvoarias onde os trabalhadores trocavam mão de obra por, no máximo, um prato
de comida. A gente fez esse trabalho, ele teve uma repercussão enorme,
principalmente no exterior,
porque 90 por cento do
aço que é produzido ali é exportado para os Estados Unidos, para a Nucor
Corporation e para a National Material Trading (NMT).
|
|
|
As carvoarias auditadas
pelas empresas estão sendo usadas como fachada para esquentar carvão do
desmatamento e do trabalho escravo
|
|
|
-Eles continuam sendo os principais compradores?
-Continuam. Naquela época houve uma grande mobilização de organizações da
sociedade civil e de entidades de classe. E aí foi assinado em Brasília, com a
participação da FIESP, do Instituto Ethos, do Ministério Público Federal,
do Ministério Público do Trabalho, do Observatório Social e das siderúrgicas
envolvidas, a carta compromisso pelo fim do trabalho escravo no setor do aço.
As
empresas iniciaram naquela época uma série de atividades para controlar o
trabalho escravo nas carvoarias. Criaram o Instituto Carvão Cidadão (ICC)
que passou a auditar as carvoarias que fornecem para as siderúrgicas. Então o
ICC visita as carvoarias e verifica se os trabalhadores estão registrados,
se têm água potável, se eles têm as condições mínimas de direitos como pessoas,
se têm seus direitos fundamentais respeitados. Isso foi feito de 2004 até agora.
-O
que aconteceu esse ano?
-Eu
tinha algumas apurações que eu vinha fazendo desde o ano passado e a gente foi
checar de fato se a produção de carvão estava sendo de forma sustentável. E aí
nós chegamos à seguinte situação:
as carvoarias auditadas
pelas empresas estão sendo usadas como fachada para esquentar carvão do
desmatamento e do trabalho escravo.
Em
resumo: as
siderúrgicas resolveram o problema das carvoarias que são auditadas. Só que
essas carvoarias produzem muito mais do que a sua própria capacidade. Elas
produzem o que elas conseguem produzir e elas vendem o que as outras, ilegais,
produzem.
Quando digo ilegal eu
digo o seguinte: madeira roubada de terra indígena, madeira retirada ilegalmente
de área de preservação ecológica e muitas vezes produzida com trabalho escravo.
Entra, contamina a cadeia produtiva do aço, ou seja, o problema, apesar dos
esforços realizados até aqui, ele permanece.
A
gente está numa situação em que os recursos naturais da Amazônia estão quase que
privatizados. E extraídos de forma predatória por um pequeno grupo de empresas.
Quem se beneficia com isso? Empresários locais, políticos e muitos servidores do
Estado do Pará que estão sendo comprados pelos esquemas de lavagem de carvão.
-Seriam então três os principais crimes…
-A
gente tem o trabalho escravo, devastação ilegal e corrupção. Corrupção ativa e
passiva. E aí você tem pequenas carvoarias que estão sendo usadas como fachadas
para esquentar carvão, e você tem uma quadrilha que opera nos porões da
secretária de Meio Ambiente do Estado do Pará.
E
essa quadrilha foi muito fortalecida ao longo dos últimos anos. No governo do
PT, ela cresceu muito no governo da Ana Júlia. E ela permanece no
governo hoje do PSDB. Ela transcende agremiações políticas. Ela sobrevive
a partidos, a governos, a gestões.
-O
senhor poderia dar nomes ou funções?
-Existem
dezenas de funcionários envolvidos na corrupção. Não existe um ou outro. São
dezenas. Funcionário que, por exemplo, ganha mil reais por mês e tem um carro de
R$ 120 mil. Salvo exceções, o chefe do esquema é o secretário do Meio Ambiente.
-Na
sua pesquisa você conta que falou com o ex-secretário, o Walmir Ortega,
secretário de Meio Ambiente do Pará entre 2007 e 2009, no governo de Ana Júlia
(PT)…
-O
Ortega foi colocado lá para tentar moralizar o negócio. Só que ele mesmo
falou que não segurou a onda. Ele não conseguiu. Ele afastou mais de 200
funcionários da Secretaria de Meio Ambiente. Mesmo assim ele não conseguiu
resolver o problema.
-Quem são esses funcionários?
-São
fiscais, são burocratas que trabalham internamente. São profissionais que
trabalham com a parte de informática, porque eles conseguem jogar no sistema
créditos de carvão de madeira, créditos legais, virtuais, são autorizações
virtuais. Você consegue ter um lote de madeira virtualmente legal. Só que você
preenche uma autorização de desmate com madeira ilegal. Existem caixas e caixas
de documentos em poder do Ibama e da Polícia Federal e também nossa que
mostra como operam esses esquemas. Eles estão fartamente documentados.
-Você disse que o chefe é o secretário de Meio Ambiente. Hoje também?
-Hoje eu não sei. Porque é nova a secretária de Meio Ambiente que está lá. A
gestão dela não tem nem seis meses.
-O
gestor que encerrou no final do ano passado era chefe?
-Ele, no mínimo, conhecia o esquema.
O governo do Estado do
Pará trabalha a favor das empresas que destróem o meio ambiente. Eu não tenho
nenhuma dúvida em afirmar isso. É uma questão de Estado. Ela transcende o
governo. É uma ação de Estado para proteger a devastação ambiental, a
privatização dos recursos naturais. Então é um crime contra a humanidade o que
está acontecendo lá.
-É
possível dizer que o principal responsável é o governo do Estado do Pará?
-O
governo e as empresas. O governo tem uma atitude passiva. Ele é o passivo da
história. E as empresas aplicam a corrupção ativa.
A siderurgia hoje, no Pará, só funciona porque existe a corrupção e porque
existem crimes ambientais não investigados.
|
|
|
O governo federal
também tem responsabilidade na medida em que ele não oferece a logística
necessária para os órgãos federais que estão lá, a Polícia Federal e o Ibama
|
|
|
-Quais são esses crimes ambientais?
-Devastação ilegal, roubo de madeira de terra indígena, contaminação do meio
ambiente, e aí você tem grilagem de terra e você tem assassinatos. Quer dizer,
as pessoas estão sendo assassinadas para que esse esquema continue de pé.
O Zé Cláudio, a mulher
dele, toda essa turma que foi assassinada lá nas últimas semanas, eles morreram
porque denunciavam a devastação ambiental para produzir carvão e para produzir
madeira.
-É
uma infeliz coincidência que o seu estudo saia tão pouco tempo depois da morte
do Zé Cláudio e da sua esposa e de todos esses outros assassinatos. Como é isso
lá? É um faroeste mesmo?
-É
faroeste. É uma situação medieval. O que impera lá é a lei da pistola.
-Quem são esses assassinos?
-São
pistoleiros contratados por madeireiras, pelos grupos econômicos que retiram a
madeira para fazer carvão e para fazer toras para beneficiamento e para produção
de madeira.
-Essas mesmas empresas que estão denunciadas no seu trabalho?
-As
carvoarias. As siderúrgicas financiam esse processo.
-O
serviço sujo não é com elas….
-Elas não sujam a mão de sangue. Elas financiam.
As siderúrgicas têm
responsabilidade diretas por esses assassinatos.
Elas são
diretamente responsáveis por esses crimes na medida em que financiam as empresas
que desmatam e usam trabalho escravo. Isso precisa ficar bem claro.
Eu não estou dizendo que eles mandam matar. Eles só financiam quem patrocina os
assassinatos.
O
governo federal também tem responsabilidade
-O
Estado do Pará também é responsável por esses assassinatos?
-Exato. Pela omissão e pela corrupção. Existe uma responsabilidade direta por
esses crimes por parte do Estado. Do governo do Pará, dos servidores que estão
se vendendo para o crime organizado. Grandes empresas e o governo do Pará têm
responsabilidade por essas mortes.
-E o
governo federal?
-O
governo federal também tem responsabilidade na medida em que ele não oferece a
logística necessária para os órgãos federais que estão lá, a Polícia Federal e o
Ibama. A corrupção no Ibama e na Polícia Federal é infinitamente
menor.
-Não
chega a corromper a estrutura?
-No
caso do governo do Pará, a estrutura está podre. No caso do Ibama e da
Polícia Federal o principal problema é a falta de pessoas e de equipamentos para
fazer isso. Quer dizer, se você visitar o escritório do Ibama em Marabá,
eles têm duas ou três equipes de fiscalização. Para uma região enorme. Eles
precisariam ter de 15 a 20 equipes de fiscalização.
-Quem dá o combate é o governo federal?
-O
governo federal tem uma responsabilidade e o governo estadual tem outra. O
controle eletrônico, de quanta madeira e de quanto carvão é movimentado é feito
pelo órgão estadual, pela Secretaria de Meio Ambiente. O poder de manipular
eletronicamente os dados está nas mãos do governo do Estado.
O
governo federal, através do Ibama, concede autorizações mediante as
próprias autorizações já concedidas pelo governo do Estado. Ele fiscaliza os
planos de manejo, ele fiscaliza as rodovias para ver se o caminhão que está
transportando carvão está com toda a documentação necessária.
Deveria ser uma atividade compartilhada. Só que essa atividade tem falhas
porque, primeiro, o órgão estadual é completamente corrupto e, segundo, o órgão
federal não tem recursos humanos e financeiros suficientes para desenvolver essa
atividade.
A Polícia Federal acaba
atuando mais com a investigação dos crimes a partir do momento em que ele
acontece. Não existe uma ação preventiva.
Quer
dizer, a Polícia Federal entra quando a coisa já esta feita ou dá suporte quando
necessário para a fiscalização do Ministério Público Federal, do Ibama,
do Ministério Público do Trabalho.
-Quanto do aço consumido no país vem dessa região?
-30
por cento do ferro-gusa é produzido lá. Por que o ferro-gusa de lá é tão bom?
Porque ele usa carvão vegetal, que tem baixíssimo teor de impurezas, enxofre,
essas coisas.
Quando você tem um
gusa com baixa impureza, você consegue tirar os aços especiais, que é o aço para
a indústria aero-espacial, para a indústria automobilística, para usar em
computadores, celulares, é um aço muito puro. Mas para isso você precisa de
carvão vegetal.
Por
isso que aquele carvão é tão importante na cadeia produtiva.
30 por cento da
produção nacional de ferro-gusa está lá no pólo da Amazônia.
O restante está em Minas Gerais, tem alguma coisa no Mato Grosso, na Bahia, no
Espírito Santo…
Eu
não sei quanto, hoje, isso representa em termos de contaminação pela devastação,
mas até agosto a gente vai divulgar um estudo que vai pegar os três biomas:
Pantanal, Cerrado e Amazônia. A gente vai fazer um cruzamento das informações
desses três biomas para saber quanto o setor siderúrgico contribui para a
devastação ambiental no país.
Trabalho escravo e devastação ambiental
A indústria siderúrgica
no Brasil é controlada por oito grandes corporações. Essas que a gente está
falando elas são links dessas oito grandes corporações.
Elas abastecem a indústria global do aço. Mas é um recorte. Precisa estudar
todos os biomas. Nós estamos fazendo isso. A parte de campo já está pronta.
|
|
|
O Estado e as empresas
públicas, e os bancos públicos eles não podem financiar a devastação ambiental,
é absolutamente inaceitável você ter o BB e o BNDES financiando trabalho escravo
|
|
|
-É
possível que em outros biomas tenha problemas similares?
-É
possível não: com certeza. No Pantanal tem problema de devastação para fazer
carvão, tem problema de contrabando de carvão do Paraguai para alimentar
as siderúrgicas de Minas Gerais e tem a devastação do Cerrado para alimentar as
siderúrgicas de Minas Gerais. Então
você tem três dos mais
importantes biomas nacionais, Cerrado, Pantanal e Amazônia, sendo devastados
para produzir aço.
-Com
trabalho escravo nos três?
-Com
trabalho escravo e devastação ambiental. O trabalho escravo está mais presente
no Pará. O Pará é o Estado que mais tem trabalho escravo hoje em atividade.
-Como você vê a chegada da Vale à região?
-A
Vale tem uma história de responsabilidade social e empresarial que deve
ser levada em conta. Ela tem um poder enorme de influência sobre o governo,
sobre outras empresas e tal. A Vale assinou em 2008 um acordo com o
Ministério Público que não iria mais fornecer minério de ferro para as empresas
ligadas ao desmatamento. Com essa pesquisa eu conversei com a Vale e a
Vale me disse que vai apurar. Eu acho bacana a Vale apurar e ela se
colocar diante disso.
Ou
seja, como ela vê essa questão, e como é que ela vai se posicionar depois do
lançamento da pesquisa. Porque ela disse “a gente não tem dados suficientes, a
pesquisa ainda não foi lançada, mas de imediato eu posso garantir que nós vamos
apurar”. É o que eu espero, que a Vale tome a postura correta, pelo
tamanho que ela tem, pela influência nacional e internacional.
-Aquela é uma região que tem tido um boom populacional. Isso piora a situação?
-Não
sei se piora. Precisaria fazer um estudo. Se elas forem para lá e tiverem um
emprego qualificado, trabalhando para uma indústria responsável do ponto de
vista socio-ambiental, eu acho que é ótimo. Quanto mais gente melhor.
A
mesma coisa acontece lá em Altamira. Altamira é uma cidadezinha linda de morrer.
E que agora vai ficar oito vezes maior por causa de Belo Monte. Que impacto isso
vai causar? Vai ter um impacto enorme. A cidade não vai mais ser a mesma. As
pessoas lá dormem de porta aberta. Vai chegar lá pesado o tráfico de drogas, a
exploração sexual infantil, que isso sempre chega com as grandes obras se você
não tem uma ação social paralela.
No
Polo de Carajás, o que falta ali é formação, as pessoas não tem formação. Elas
não estão preparadas para o mercado de trabalho não predatório. Elas foram
criadas para devastar a floresta. Claro, tem os grupos que vivem e interagem,
são aquelas comunidades mais tradicionais, que aprenderam a conviver com a
natureza, como as populações indígenas e as comunidades extrativistas.
Agora, os caras que estão chegando lá, do Maranhão, que desce lá pra Marabá e
tal, eles sabem operar motosserra, derrubar árvore, plantar área para pasto. E
eles ganham uma merreca quando ganham alguma coisa.
-A
legalidade quebraria as siderúrgicas?
-Se
hoje você parar de usar madeira do desmatamento e do trabalho escravo, o setor
siderúrgico entra em colapso.
Da região da Amazônia. O desafio é brutal. Como produzir aço sem destruir o
planeta? É possível? É totalmente possível.
-Como se faz isso?
-No
caso do carvão você tem que usar a floresta plantada. Tem que plantar eucalipto
para fazer carvão. Por que isso não acontece se é tão simples assim? Porque o
preço do carvão de eucalipto plantado é dez vezes mais caro que o da Mata Nativa
retirado ilegalmente.
-Mas
é o mesmo carvão que gera um aço de melhor qualidade?
-Exatamente. Continua sendo o carvão vegetal. O eucalipto demora mais para
crescer e é mais caro. O valor da natureza não está sendo levado em conta. A
árvore já está lá prontinha para ser abatida. Então você paga um cara para
abater a árvore e você gasta uma merreca e você tem o carvão rapidamente, um
carvão de ótima qualidade. Já faz logo um pasto, já bota um gado. As empresas
precisam levar em conta o valor da natureza.
A natureza não é das
empresas. A natureza é da humanidade, é da população, é do povo. Não pode
privatizar os recursos naturais desse jeito predatório.
Não tem pé nem cabeça, é uma coisa medieval, uma coisa de príncipes encastelados
com seu vassalos lá no vale plantando para eles viverem.
-E
o financiamento público de empresas, que você cita no estudo?
-O
MPF está acusando o BNDES e o BB de emprestarem dinheiro para as empresas que
estão devastando a floresta, usando trabalho escravo na cadeia produtiva.
É um exemplo do Estado cúmplice do processo predatório. No meu entender não
pode. O Estado e as empresas públicas, e os bancos públicos eles não podem
financiar a devastação ambiental, é absolutamente inaceitável você ter o BB
e o BNDES financiando trabalho escravo. Não pode acontecer, de forma
alguma. Precisa mudar, precisa ficar mais atento. E precisa aprovar a PEC
do trabalho escravo.
-E o
que é possível fazer no caso do Pará? Vem de vários governos, passou pelo
Jatene, Ana Júlia, voltou para o Jatene…
-É
muito poder, é muita grana. Eles controlam, eles dominam a região. Eles mandam e
desmandam. E aí você tem desde a influência econômica dos altos escalões, a
compra, a corrupção e na linha de frente, na linha mais baixa, você tem a
pistolagem. Ou seja, ou você se enquadra ou nós vamos passar fogo mesmo.
É tudo o mesmo
esquema, é tudo o mesmo negócio. Seja a alta corrupção, o crime do colarinho
branco, ou a pistolagem, é tudo para beneficiar os esquemas de devastação
ambiental.
|
|
|
O que o estudo está
fazendo é responsabilizar as grandes tradings de aço e as grandes montadoras por
comprarem o aço feito com carvão ilegal
|
|
|
-O
principal negócio a se beneficiar disso tudo é o aço?
-No
caso do carvão é o aço. Agora, você tem a madeira, por exemplo, e aí você tem a
indústria da construção civil. E aí você tem as grandes incorporações
imobiliárias. A cidade de São Paulo está calçada na devastação da Amazônia.
Esses prédios novos que estão sendo erguidos é com madeira ilegal.
60 por cento da madeira
usada na construção civil aqui em São Paulo é madeira do desmatamento ilegal.
-E
usa o mesmo esquema do carvão?
-Lavagem. É o mesmo esquema do carvão. O princípio é o mesmo e as quadrilhas são
as mesmas. Só que a madeira de melhor qualidade vem para cá, para móveis, pisos
e construção civil e o que sobra vai para o carvão. (As madeireiras ilegais)
entregam para a madeireira legal e aquela madeireira legal vai distribuindo.
Mas
para que isso aconteça a madeireira precisa ter o documento dessa madeira. E
esse documento é fornecido pelos esquemas de corrupção do governo do Estado. O
documento que acompanha essa madeira é forjado. E só é possível isso porque você
tem a corrupção do governo do Estado. Carimba a madeira ilegal com uma maquiagem
de madeira legal.
A pecuária também se
beneficia porque você limpa as áreas, são as mesmas quadrilhas também. Que se
beneficiam das áreas. E aí a carne também está contaminada. E os frigoríficos
usam a madeira para as caldeiras. E não é o povo da Amazônia que se beneficia.
São grandes corporações industriais que não valorizam o preço da natureza.
Depredando o planeta em nome de interesses mesquinhos.
-Como por exemplo as siderúrgicas americanas?
-As
siderúrgicas daqui que financiam as carvoarias e as carvoarias fazem o serviço
sujo.
-Quem está em cima?
-As
grandes tradings de aço globais. E você tem as montadoras.
A Nissan, a Toyota…
Elas estão envolvidas, estão comprando esse produto. Não é uma acusação que a
gente está fazendo, é um alerta. Essas empresas financiam a devastação da
Amazônia. À medida que elas compram de siderúrgicas que se beneficiam do
trabalho escravo e da devastação, elas financiam uma cadeia produtiva perversa.
Se
elas levassem em conta seus próprios estatutos, não poderiam comprar. Elas têm
responsabilidade, elas não têm culpa. O que o estudo está fazendo é
responsabilizar as grandes tradings de aço e as grandes montadoras por comprarem
o aço feito com carvão ilegal.
-Essas empresas tem responsabilidade, e culpa quem tem?
-O
governo do Estado do Pará e as siderúrgicas do pólo de Carajás. Essas têm culpa
criminal.
-Quem são os políticos que se beneficiam?
-Uma
das quadrilhas é liderada pelo vice-prefeito de Anapu, Laudelino Délio
Fernandes Neto. Ele está envolvido na morte da irmã
Dorothy Stang,
e é um dos chefes da quadrilha. Desviou no ano passado um milhão de m³ de
carvão. Usou 33 empresas de fachada para abastecer as siderúrgicas com carvão do
desmatamento. Aí você vai ver as associações.
-Quem é o Délio?
-É o
principal sócio do Jader Barbalho na máfia da Sudam, naquele mega-desvio
de R$ 270 milhões, em uma investigação que está engavetada porque envolve gente
muito poderosa. Então o alto escalão da política paraense está envolvido.
-O
que você acha do novo Código Florestal?
-Se
for aprovado da forma como está,
vai ser uma brutal
contribuição para os crimes ambientais que acontecem na região.
-A
anistia é para essa gente?
-É
para essa gente. O governo federal vai perder o poder que tem hoje de
fiscalização. As atribuições do Estado vão aumentar.
O
poder de corrupção vai aumentar. O poder público estadual está totalmente
corrompido, os caras vão deitar e rolar. E com a anistia então… Tem carvoaria
com mais de R$ 400 milhões em multa.
-Se
for aplicar isso aí, quebra.
-Quebra. Mas ela não pode funcionar. Não tem condições de continuar funcionando.
Totalmente ilegal. Figueiredo Magalhães, por exemplo, fornece para a
Tramontina. Essa empresa tem quase R$ 400 milhões em multa e ela já foi
embargada várias vezes e continua operando. Por que continua operando? Porque
tem costas quentes na política local.
Financia campanha, elege prefeitos.
|