Após sete dias de diálogo, o governo de
fato tirou a máscara e deixou evidente
uma tática protelatória, rejeitando o
conteúdo do ponto 6 do Acordo de San
Jose que prevê a restituição do
presidente Manuel Zelaya Rosales.
O objetivo desta estratégia é chegar o
mais próximo possível das eleições de
novembro, cujo processo será
estritamente controlado e manipulado
pelos poderes golpistas, incluindo o
Exército. Eleger novas autoridades,
esperar que mandato do presidente
Zelaya chegue ao fim e se acabe a
unidade da comunidade internacional em
não querer reconhecer os resultados
eleitorais.
Diante desta situação, e enquanto o
presidente Zelaya continua à
espera, no dia 19 de outubro,
de uma resposta final da Comissão de
Roberto Micheletti, a
Frente Nacional Contra o Golpe de Estado
iniciou um processo de desconhecimento
das eleições, que possivelmente será
ratificado no próximo dia 23 outubro,
após consulta com os candidatos
presidenciais e com a base do Partido
Liberal, já que rechaçaram o golpe.
Em meio a essa situação difícil,
continua também a repressão do governo
de fato.
Após o fechamento da Rádio Globo
e do Canal 36, e da perseguição
constante a todos os meios de
comunicação que continuam denunciando as
atrocidades cometidas pelo governo de
fato, nos últimos dias a Rádio Cadena
Voz , de propriedade do ex-presidente
Ricardo Maduro, decidiu
encerrar os programas de rádio do
Movimento de Mulheres para a Paz "Visitacion
Padilla”, do Centro de Estudos da Mulher
e do Centro de Direitos da Mulher, por
terem feito "comentários e afirmações
que transgridem os princípios e bens
jurídicos, consagrados na Constituição,
na Lei Eleitoral e nas Organizações
Políticas".
Além disso, em 17 de outubro, faleceu o
presidente do
Sindicato dos Trabalhadores do Instituto
de Formação Profissional (SITRAINFOP),
Jairo Sánchez, baleado no
rosto por policiais em 23 de setembro
passado, enquanto participava ativamente
das mobilizações nos bairros da capital,
desafiando o toque de recolher imposto
pelo regime de fato.
Totalizam-se já 18 pessoas da
Resistência assassinadas pelas forças
repressoras e centenas de feridos e
detidos ou processados. Para analisar
esse aspecto, que muitas vezes passa
despercebido em notícias de jornal, o
Sirel conversou com Nectaly
Rodezno, coordenador da Frente
dos Advogados Contra o Golpe de Estado.
- Quantas pessoas a Frente dos Advogados
auxiliou desde que foi dado o Golpe de
Estado?
-Pelo menos 100 pessoas foram acusadas
de sedição, danos agravados, roubos e
terrorismo. Entre essas 100 pessoas
temos 7 com prisão preventiva e as
outras estão livres, mas com medidas
substitutivas de prisão preventiva.
Além disso, nós liberamos mais de 800
pessoas que foram presas e feridas
durante a sua participação nas
atividades da Resistência, muitas delas
crianças e idosos.
- Qual tem sido a atitude dos juízes e
dos membros do Ministério Público nestes
casos?
-Em todos estes casos, temos visto como
os juízes da Corte Suprema de Justiça (CSJ)
e a maioria do Ministério Público
chegaram a acordo sobre a resolução
antes do início da audiência. Desta
forma, eles violam diversos artigos
constitucionais, tais como o direito ao
devido processo legal. Há uma forte
pressão de juízes do CSJ para que
procedam desta forma.
-
Estas violações poderiam ser penalizadas
no futuro?
-O Artigo 5 do Estatuto de Roma do
Tribunal Penal Internacional define os
crimes contra a humanidade dentro de sua
esfera de responsabilidade. O Artigo 7
define quais são os crimes contra a
humanidade e entre eles está a
perseguição de um grupo por motivos
políticos e o não respeito aos
procedimentos estabelecidos por lei.
Estamos preparando toda a documentação
para levá-la a esta instância
internacional. Não vamos aceitar nenhuma
anistia e nem vamos descansar até vê-los
processados.
- Você já foi pressionado por defender
os membros da Resistência?
-Houve uma perseguição muito sutil. No
meu caso, por exemplo, os juízes estão
prejudicando o meu trabalho como
advogado ao sentenciar contra meus
clientes, mesmo não sendo casos
relativos a Resistência. Obviamente eles
estão procurando me prejudicar
economicamente.
A polícia quis me capturar várias vezes
e não conseguiu, graças à presença de
jornalistas internacionais. No entanto,
isso faz parte dos riscos que corremos
quando envolvidos em um movimento como
este.
- A presença maciça na CSJ e na
Procuradoria de profissionais que atuam
contra os membros da Resistência é
devida a fatores ideológicos ou a outros
fatores?
-Há
casos em que o fator é ideológico, mas a
maioria persegue interesses pessoais,
por medo de ser demitido ou processado.
O que lhes interessa é comer e viver bem
e não pensam no estrago que esse Golpe
de Estado está causando a todo o povo.
- Como é que vão curar as feridas
abertas pelo golpe de Estado?
-As feridas podem ser curadas apenas
convocando uma Assembleia Nacional
Constituinte, dissolvendo a Corte
Suprema de Justiça, o Ministério Público
e o Tribunal Superior de Contas.
A CSJ é totalmente tendenciosa
contra os membros da Resistência,
enquanto que, no caso do Ministério
Público, há um grande número de estupros
e assassinatos ocorridos após o Golpe de
Estado e não há uma única pessoa
identificada como responsável por estes
fatos. Há pessoas que foram
identificadas por estes crimes e a
Promotoria nem sequer deu entrada na
denuncia. No caso do Tribunal Superior
de Contas é preciso que investiguem as
pessoas responsáveis pelo desperdício e
desvio do dinheiro público.
As feridas só poderão ser curadas com
mudanças estruturais.
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