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Com
Carlos H. Reyes
“Não
se esqueçam de Honduras”
A Frente Nacional
de Resistência Popular na Europa |
Honduras se
converteu em um campo aberto para a caça indiscriminada e impune aos opositores
da atual democradura. Quem se mover e protestar estraga a fotomontagem que
circula pelos Estados Unidos, pela União Europeia e pela mídia hegemônica, com a
falsa imagem de que tudo voltou ao normal após as eleições de novembro passado.
O silêncio premeditado e cúmplice sobre Honduras, por sua vez, reflete as sérias
questões sobre a escassa densidade democráticos em muitos países.
-Quantos
dias vocês estiveram na Europa?
-No
total, foram uns 15 dias. Além de participar da reunião do
Comitê
Executivo Mundial da UITA,
do qual formo parte, também fui a uma série de encontros com organizações irmãs
da
França
e da
Suíça,
convidado pelo
SOLIFONDS٭.
-A
idéia foi romper todo este silêncio sobre Honduras, um silêncio que cheira a
cumplicidade ...
-Sim, fomos denunciar o que está acontecendo no país, a perseguição que sofrem
os dirigentes da
Frente Nacional
de Resistência Popular
(FNRP)
e todos os que se opuseram ao golpe de Estado em
Honduras.
Como já
dissemos oportunamente, o golpe de Estado teve efeitos políticos muito
negativos, e desconsiderou também muitas conquistas e progressos do movimento
operário.
-Os
empresários se aproveitaram
do
golpe ...
-Os
empresários não só se aproveitaram do golpe, como também promoveram o golpe. Grande
parte dos empresários hondurenhos tentou criar antes do golpe uma lei para
implementar o trabalho temporário por três anos. Eles disseram que com esta lei
estariam aumentando o emprego no país e também promovendo a meia jornada de
trabalho. Isso não aconteceu, graças à oposição e à mobilização dos
trabalhadores.
Não
passou no Congresso, mas com as condições atuais do país, onde impera uma
repressão brutal, eles se dedicaram a aplicar a lei, porque o Ministério do
Trabalho não faz quase nada, e se você vai a um Tribunal, terá de esperar anos
para que haja um julgamento.
Nos
restaurantes de fast-food despediram todos os trabalhadores e agora somos
contratados por meia jornada de trabalho, só que em vez de trabalharmos como
corresponderia, ou seja quatro horas, temos que fazer seis e só ganhamos a
metade do salário.
Esta é
uma forma de vingança contra o salário mínimo implementado no governo de
Manuel
Zelaya, o qual só cobria 80 por cento do valor da cesta básica mínima.
-A
comunidade empresarial hondurenha, marcada por um firme antissindicalismo, está
se sentindo confortável com toda a repressão que atualmente assola o movimento
sindical?
-Você
que já esteve em
Honduras
sabe muito bem que a situação de lá nunca foi fácil. Agora há uma perseguição
seletiva contra os dirigentes sindicais, contra os ativistas mais proeminentes
da
Frente Nacional de Resistência Popular. O
número de militantes políticos, camponeses, professores, jornalistas e
sindicalistas assassinados não pára de crescer. Todos os dias somos informados
de um novo ato de violência e de intimidação.
A
UITA
manifestou o seu rechaço e exigiu esclarecimentos sobre o caso envolvendo o
companheiro
Porfirio Ponce,
vice-presidente do nosso Sindicato,
quando homens
mascarados invadiram violentamente a sua casa, levando o seu computador e
deixando a sua cama cheia de sangue ... e nada aconteceu, ninguém investigou
nada.
Assim estão as coisas!
-E
agem com total impunidade...
-Exatamente,
e o mais triste é que estes são os mesmos grupos que na década de 80, quando
havia a guerra de baixa intensidade na
América Central,
assassinaram e sequestraram mais de 300 hondurenhos, a maioria deles integrava o
movimento sindical camponês e popular, levando a um grande enfraquecimento do
movimento na época.
-Repressão
direta e criminalização do protesto social...
-É o que
vem acontecendo com o
Sindicato dos
Trabalhadores da Universidade Nacional Autônoma de Honduras
(SITRAUNAH),
onde onze integrantes da direção foram detidos pela Polícia. Este importante
Sindicato, desde julho do ano passado, está negociando o Convênio Coletivo. Os
companheiros detidos foram libertados hoje, sob medidas cautelares e, portanto,
não podem participar da negociação.
O Ministério Público acusou os sindicalistas de crimes por sedição, usurpação, e
coerção ao ocuparem as instalações da UNAH. Este processo de
criminalização do qual os nossos companheiros são vítimas, também ocorre em
outros âmbitos onde a estratégia é paralisar os protestos sociais.
-E
mostrar uma imagem segundo a qual tudo está tranquilo ...
-Correto,
as eleições serviram ao projeto dos
Estados Unidos
de mostrar ao mundo que tudo voltou ao normal em Honduras, e desta maneira pedir
aos países para retomarem as relações diplomáticas.
O número de militantes políticos, camponeses, professores,
jornalistas e sindicalistas assassinados não pára de crescer. Todos
os dias somos informados de um novo ato de violência e de
intimidação.
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- Como está
o moral da Resistência?
-
Continua o mesmo, forte. Nos anos 80, tivemos uma experiência semelhante, de
muita repressão. Hoje podemos dizer que há mais experiência e estamos todos de
acordo sobre a necessidade de nos unirmos e lutar juntos.
Desde 1956 já suportamos sete golpes de Estado, e os "gringos" fazem com o nosso
país o que querem, da mesma forma que o narcotráfico, que o crime organizado,
que os políticos corruptos, aliás todo mundo faz o que quer com a gente. Só quem
pode dar um fim a tudo isto é o movimento popular, é o povo organizado
politicamente. Por isto, seguimos adiante, como o nosso plano para recolher
assinaturas visando uma Assembleia Constituinte.
-
Você está preocupado com o manto de silêncio que cobre Honduras?
-Claro que sim.
Nesta viagem à
Europa,
mais precisamente ao sul da
França,
um dos companheiros que realizavam a atividade organizou uma série de
entrevistas com vários jornalistas que nos perguntavam sobre o processo do
golpe. Falamos sobre a resistência em
Honduras
e sobre a necessidade de recebermos
apoio. Durante a minha estada, os organizadores quiseram que eu fosse
entrevistado por um dos diretores do
Le Monde,
justamente o
responsável pela
América Latina,
quem lhes respondeu que
Honduras
após as eleições já não estava mais na agenda do jornal.
Essa é a grande mentira que tem sido difundida, que após as eleições
foram resolvidos todos os problemas de Honduras, todas as penúrias
do povo, todas as suas misérias. E isso é terrível, é uma forma de
dizer ao governo: "Continuem fazendo o que quiserem, porque nós
estamos preocupados com outras coisas".
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Essa é a grande
mentira que tem sido difundida, que após as eleições foram resolvidos todos os
problemas de Honduras,
todas as penúrias do povo, todas as suas misérias. E isso é terrível, é uma
forma de dizer ao governo: "Continuem fazendo o que quiserem, porque nós estamos
preocupados com outras coisas".
Quando a imprensa se cala, a repressão ganha
invisibilidade. É
por isso que valorizamos tanto a ajuda da imprensa comprometida, a ajuda que
recebemos de vocês com as suas denúncias na
Rel-UITA, bem como a ajuda da
TELE SUR
e da própria Internet que nos permite ter um pouco de voz.
- O seu braço, que a polícia
quebrou, está doendo muito?
- Dói um pouco,
mas o que mais me dói é a dor do meu país. É um retrocesso! Esta gente aprovou
um plano de nação para até 2038. Até lá o que eles vão ficar fazendo?
Implementando o neoliberalismo e aplicando todas as medidas para promoverem a
oligarquia, bem como desarticulando a resistência e o movimento sindical, nada
mais nada menos que o mais articulado da
América Central.
Por isso, estamos fundamentalmente fazendo com que as pessoas entendam que esta
é uma luta de classes. Logo, a dor de um braço quebrado pela polícia não é nada
se compararmos com a dor do meu país.
Esta outra dor é maior.
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Gerardo Iglesias
Rel-UITA
31 de maio de
2010 |
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SOLIFONDS é uma fundação da União dos Sindicatos Suíços (USS),
do Partido Socialista Suíço (PSS), da Ajuda Obreira Suíça (OSA) e de diversas
ONG.
Fotos: Giorgio
Trucchi
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