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Honduras

A dupla moral

dos poderes fácticos

Pedem diálogo, mas continuam reprimindo o povo

 

O Decreto Executivo ilegal anunciado pelo governo de fato acabou abrindo uma primeira fissura na sólida unidade exibida até agora pelos setores econômicos e políticos que conduziram o golpe de Estado. Uma surpreendente proposta de diálogo apresentada pela empresa privada surgiu em um contexto de constante violação dos direitos daqueles setores do povo hondurenho que se negam a aceitar a derrota institucional do dia 28 de junho passado.

Samuel Sánchez

Ramón Navarro

Noelia Núnez

 

Pelo segundo dia consecutivo a Resistência não pôde realizar a sua marcha habitual pelas ruas de Tegucigalpa. Em cumprimento do Decreto Executivo que continua restringindo as liberdades individuais e coletivas da população, e que parece ser um novo e desestabilizante erro do governo de fato de Roberto Micheletti, mais de 200 efetivos fortemente armados fecharam a saída para centenas de pessoas que se concentraram em frente à Universidade Pedagógica.

 

Além do fato de ser ilegal pela sua publicación na Gazeta Oficial antes mesmo da sua aprovação pelo Congresso Nacional, o decreto abriu um profundo debate entre os setores que conduziram e aprovaram o golpe de Estado.

 

Enquanto os deputados e os candidatos presidenciais dos partidos tradicionais pediam a Micheletti que reconsiderasse o conteúdo de tal decreto e a comunidade internacional exigia uma solução definitiva para a grave crise causada pelo golpe de Estado, de forma inesperada a empresa privada apresentou uma proposta que retomava alguns dos pontos contidos no Acordo de San José e que deixa o presidente Manuel Zelaya sem nenhum instrumento real para governar.

 

Nessa proposta, apresentada pelo conhecido empresário Adolfo Facussé, seria aceita a restituição do presidente Manuel Zelaya na Presidência, porém com a condição de que se submetesse imediatamente aos tribunais de justiça.

 

Os novos ministros seriam nomeados pelos partidos políticos proporcionalmente aos votos obtidos nas últimas eleições e poderiam ser removidos apenas com o voto de dois terços do Congreso, enquanto que o mandato das Fuerzas Armadas estaria a cargo do gabinete do governo.

 

Uma força multinacional, composta por uns 3 mil militares ou policiais do Canadá, Panamá e da Colombia vigilaria o cumprimento do acordo, e a comunidade internacional deveria respaldar incondicionalmente o desenvolvimento das eleições do dia 29 de novembro, enquanto que Roberto Micheletti passaria a ocupar um posto de deputado com a garantia de um trono vitalício.

 

Nas próximas horas serão esperadas reações do presidente Zelaya e a Frente Nacional Contra o Golpe de Estado.

 

Diálogo e repressão

 

Enquanto a palavra “diálogo” continua satisfazendo os titulares dos principais meios controlados pelos poderes econômicos de Honduras, a repressão contra o povo hondurenho não cessa em nenhum instante.

 

Ontem, 29 de setembro, efetivos da Polícia chegaram ao Instituto Nacional Agrário (INA) com a aparente intenção de executar o desalojamento dos membros das organizações camponesas e sindicais que há três meses mantêm uma ocupação pacífica da instituição.

 

“Levando em conta as constantes ameaças, as organizações camponesas e nós do Sindicato dos Trabalhadores do Instituto Nacional Agrário (SITRAINA) nos mantemos firmes na nossa resistência contra o golpe de Estado -declarou a Sirel Samuel Sánchez, membro do SITRAINA, organização afiliada à UITA-.

 

Ocupamos as instalações do INA em todo o país e pedimos o apoio internacional por qualquer coisa que possa ocorrer nas próximas horas. “Vamos até o fim e sabemos que tanto a UITA como outras instâncias internacionais nos darão o seu apoio”.

 

Durante uma conferência da imprensa, os dirigentes da Confederação Nacional Camponesa (CNC), Confederação Hondurenha de Mulheres Camponesas (CHMC) e o Conselho Coordenador de Organizações Camponesas de Honduras (COCOCH) informaram que “Nossa presença no INA é a única forma de garantir os direitos dos camponeses, porque com esta toma estamos protegendo o cumprimento do Decreto 18/2008, com o qual se resolverá o tema da mora agrária, beneficiando com títulos de propriedade mais de 300 mil camponeses -disse Ramón Navarro do COCOCH-.

 

Sofremos perseguição e repressão, e nós, camponeses, nos rebelamos contra um governo ilegal e despótico. Estamos aqui defendendo os expedientes de milhares de camponeses porque não acreditamos que um governo usurpador possa realizar uma verdadeira reforma agrária.

 

Conseguimos recuperar a terra para produzir alimentos, tivemos que abandoná-la com o sangue do nosso povo -continuou Navarro- e não vamos permitir que nos oprimam mais. Nosso movimento faz parte da Frente de Resistência e se querem nos desalojar, a luta não terminará aqui, vamos nos mobilizar de outra maneira”, concluiu.

 

Ofensiva judicial

 

A intenção de deter a Resistência contra o golpe de Estado foi transferida também para os tribunais, onde dezenas de fiscais e advogados conscientes estão tentando neutralizar a onda repressora contra os que se manifestam contra o governo de fato.

 

Ontem, terça-feira dia 29, várias pessoas que foram desalojadas em frente à Embaixada do Brasil foram acusadas de rebelião e enviadas à prisão.

 

No caso de Agustina Flores López, irmã de Bertha Cáceres, membro do Conselho Cívico de Organizações Populares e Indígenas de Honduras (COPINH) e da direção colegiada da Frente Nacional Contra o Golpe de Estado, só o fato de fazer parte da Resistência foi classificado pela juíza como rebelião.

 

“Foi capturada e atacada selvagemente, e agora querem condená-la sem nenhum tipo de prova. Estamos diante de um experimento deste governo de fato para tentar desarticular a resistência impondo o terror e o medo - disse Noelia Núñez, advogada de Flores López-.

 

A justiça aqui está cada dia mais cega. Um sistema inquisidor e opressor, e que em nada garante que neste -como em muitos outros casos- considerará que as pessoas são perigosas apenas pelo fato de integrar o Movimento de Resistência Contra o Golpe.

 

Sinto-me indignada como pessoa e profissional. Recusaram as medidas substitutivas e  enviaram-na à prisão -concluiu Núñez- e é um sinal claro de que estão enviando à Resistência e a sua irmã como dirigente popular”.

 

Em Tegucigalpa, Giorgio Trucchi

Rel-UITA

13 de outubro de 2009

 

 

 

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