Honduras

Mais femicídio e violência
contra as mulheres após o golpe

     

Os femicídios, entendidos como crimes de ódio contra as mulheres por razões de gênero, aumentaram em Honduras depois do golpe de Estado, ocorrido em 28 de junho passado, de acordo com o documento apresentado pela coalizão Feministas em Resistência à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA).

 

Isso se deve ao “estado de desproteção em que se encontram as vítimas e ao enfraquecimento das instituições responsáveis pela proteção dos direitos humanos das mulheres", expressou ao SEMLac Adelay Carias, integrante das Feministas em Resistência e apresentadora do relatório sobre Violação aos direitos humanos das mulheres durante o Golpe de Estado.
 
Outra das apresentadoras do estudo disse que, em 2008, 312 mulheres morreram de forma violenta de janeiro a dezembro no país, com uma média de 26 femicídios, segundo o relatório "Morte de mulheres por violência intencional 2008" do Observatório da Violência da Universidade Nacional Autônoma de Honduras (UNAH) e  do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

Em 2009,
o número subiu para uma média de 31 crimes por mês, totalizando 325 até outubro, segundo dados fornecidos pela Promotoria da Mulher na Unidade de Investigação de Mortes Violentas de  mulheres, criada em 2008.
 
Essa promotoria é o órgão judicial do Ministério Público encarregado de defender o atual marco jurídico existente em matéria de direitos humanos das mulheres. Somente em julho, um mês depois do golpe de Estado, foram notificadas 51 mortes violentas contra as mulheres.
 
Violência contra o setor feminino também está se dando em um novo cenário de conflito político, com novos atores e novas formas de crueldade dirigidas aos corpos sexuados das mulheres.
 

As agressões contra elas, de acordo com as Feministas em Resistência e o Comitê de Familiares de Desaparecidos em Honduras, totalizam mais de 400 casos, sendo que 23 delas relataram ter sofrido algum tipo de violência ou abuso sexual por parte da Polícia Nacional no cenário da repressão sofrida durante e após as manifestações pacíficas ou durante o toque de recolher.
 
 “Sabemos que estas
denúncias não são as únicas, já que representam apenas um pequeno número de depoimentos registrados nestas instituições", declara uma feminista em resistência.
 
Os abusos cometidos, tanto pela Polícia Nacional como pelo Exército, incluem espancamentos e manipulação na vagina, seios e nádegas, incluindo ameaças de estupro e insultos com conotações sexuais (prostituta ou cachorra).

 

A mensagem dada pelos repressores, de acordo com testemunhos recolhidos pela SEMlac, é que "isto está lhe acontecendo por você não ficar em casa cuidando de seus filhos e marido" ou "isto é para você aprender a não se meter com essas coisas" , referindo-se às ações da Resistência Contra o Golpe de Estado.
 
É claro
que a intenção com estes atos é de dar uma punição exemplar às mulheres, para que voltem ao mundo privado, às suas casas, um castigo por terem entrado no mundo público e por serem parte ativa na luta contra o golpe.

 

Outra contundente expressão da violência contra as mulheres é a aprovação e publicação do Decreto 2744 na Gaceta, que é o jornal oficial da República. Neste decreto o Ministério da Saúde proíbe "o uso, venda, comercialização ou distribuição gratuita de Pílulas Anticoncepcionais de Emergência (PAE), com base no critério de que elas têm um efeito abortivo, de acordo com um parecer de 2008 do Colégio Médico citado no mesmo jornal.
 
Este é, segundo Regina Fonseca, coordenadora do Programa de Saúde Sexual e Reprodutiva do Centro de Direitos da Mulher, “outro duro golpe para as mulheres, um golpe simbólico para mostrar que os grupos conservadores e fundamentalistas deste país têm o controle sobre nossos corpos, nossas decisões e nossas vidas", disse ela.

 
"É claramente um
ato inconstitucional, não só porque qualquer medida tomada por um governo usurpador é nula, mas também porque o país ratificou convenções internacionais, existe um quadro jurídico em nível nacional e internacional para proteger a saúde sexual e reprodutiva que foi desrespeitado pelo atual Ministro de fato da Saúde.
 
Fonseca lembrou que o
titular anterior era o Presidente do Colégio Médico e "emitiu o seu parecer sobre a PAE baseando-se em um estudo sobre informação secundária, já que em Honduras não há estudos científicos a esse respeito. O decreto de 2744 tinha sido vetado pelo presidente Manuel Zelaya, que ordenou não fosse tomada uma decisão sobre o assunto sem antes conhecer o parecer da Corte Suprema de Justiça, organismo que devia chegar a uma resolução nos dias em que ocorreu o Golpe de Estado.

 

No entanto, essas ações não desanimam as lutadoras da Resistência. Maria Rosa Lopez, líder camponesa da comunidade de Ojo de Agua, Comayagua, afirma que "esta resistência tem o rosto de mulher e vamos continuar lutando até o fim, até as últimas consequências."
 
Ela compartilha sua experiência: "Fui detida no dia 3 de agosto, perto da fronteira de Las Manos (Honduras - Nicarágua) quando ia unir à marcha de apoio ao retorno do presidente. Éramos 140 pessoas detidas e fomos levadas para um posto policial.

 

"No dia seguinte, enviaram até nós um comboio militar que estaria encarregado de nos trazer a Tegucigalpa, e nós dissemos: não vamos em um comboio militar, porque não somos militares, que nos tragam um veículo civil. E não saímos de lá até que enviaram o ônibus ", diz ela.
 
Apesar destes acontecimentos, as maioria das violações dos direitos humanos das mulheres ainda não passaram pelas instâncias administrativas da justiça porque -segundo depoimento das agredidas- não confiam no sistema de justiça, nem na Polícia encarregada das investigações, já que os próprios representantes da polícia, que violentaram os direitos das mulheres, são os próprios responsáveis pela investigação criminal no sistema de administração da justiça hondurenho.

 

 

Tacuazina Morales

Tomado de SEMLac

4 de dezembro de 2009

 

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