Liminar de juíza do Trabalho obriga frigorífico de Ariquemes
(RO) a se enquadrar à lei em 5 dias. Segundo perícia,
empresa do grupo Amazon Meat fraudava folha de ponto e
submetia funcionários a jornadas de até 14 horas
O Frigorífico Santa Marina, em Ariquemes (RO), terá
até o fim desta semana para regularizar abusos na jornada de
trabalho de 315 funcionários, inclusive na fraude das folhas
de ponto para pagar menos horas extras. Uma liminar expedida
pela juíza da Vara do Trabalho de Ariquemes, Elinay
Almeida, obriga a empresa do grupo Amazon Meat
Indústria de Alimentos Ltda a não prorrogar a jornada
normal de trabalho sem acordo ou convenção coletiva, a
conceder aos empregados o período mínimo de 11 horas de
descanso entre duas jornadas, além do intervalo intrajornada
de uma a duas horas.
A empresa deverá conceder descanso semanal de 24 horas
consecutivas e parar com a manipulação da folha de ponto.
Para isso, a Justiça determinou a emissão de um comprovante
imediatamente após o registro eletrônico, como forma do
próprio funcionário fiscalizar a quantidade de horas
trabalhadas.
"Não estamos pedindo nada além do que já está previsto na
legislação trabalhista e que não era cumprido nesse
frigorífico. Esse é um trabalho extenuante e esses homens
são submetidos a até 14 horas de trabalho todos os dias.
Eles têm direito a descanso e ao lazer com a família. Mas lá,
eles não têm nada disso. Isso é inadmissível", diz a
procuradora do trabalho Flávia Bauler, responsável
pela ação civil pública contra o frigorífico.
Foram as denúncias de fraude nas folhas de ponto dos
funcionários que deram início às investigações no
Frigorífico Santa Marina ainda em 2007. Uma perícia técnica
identificou que a empresa submetia quase a totalidade se
seus funcionários a jornadas extraordinárias de trabalho e
ainda manipulava os dados do ponto eletrônico. Dos 323
funcionários em atividade à época da fiscalização, 315
trabalhavam até seis horas a mais do que o permitido por lei.
Isso significa que quase 98% dos empregados eram submetidos
a uma "jornada dupla" de horas extras não contabilizadas.
A partir desses dados, Flávia ajuizou uma ação civil
pública contra o frigorífico no dia 16 de junho, após uma
tentativa fracassada de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).
Na ocasião, o responsável pela empresa alegou, conforme
consta no processo, que "as irregularidades haviam sido
sanadas e por isso não havia necessidade de assinar o
termo". Para a procuradora, o motivo da recusa teria sido
outro. "No TAC, estava previsto o respeito ao limite
de duas horas extras por dia, que é o permitido por lei.
Eles não assinaram porque seriam obrigados a contratar mais
gente. E isso eles não querem".
De acordo com a contestação apresentada pelo advogado do
grupo, Pedro Riola, as horas extras, diferentemente
do que mostrava o relatório produzido pela fiscalização, não
eram práticas recorrentes. Na versão patronal, o labor
adicional era devidamente pago e envolvia apenas parte dos
contratados. "A extrapolação da jornada, em alguns dias, não
se converteu em riscos à saúde dos trabalhadores, muito
menos em prejuízo pecuniário".
O advogado ainda complementa: "Sua atividade [do frigorífico]
preponderante é abate e comercialização de carne bovina,
produto perecível, que deve obedecer a normas rigorosas para
manutenção da qualidade do produto. Destarte, processá-las e
embarcá-las no dia seguinte, fatalmente, levaria ao seu
perecimento absoluto, razão pela qual, em caráter
extremamente excepcional, em alguns dias existe a
necessidade de se estender a jornada de trabalho para evitar
dito perecimento", justifica Pedro Riola.
Para a procuradora Flávia Bauler, uma empresa que
abate uma média de 600 bois por dia deveria ter um número
maior de funcionários, em vez de explorar a mão-de-obra
existente. "Eles demitem muita gente. Ficam apenas com um
turno de trabalho, dependendo da demanda. Em vez de
contratar novos funcionários, que é o que deveriam fazer,
pedem hora extra para os que ficaram. Aí começam os
problemas de lesão por esforço repetitivo, lombalgia,
estresse... E [depois] eles demitem [novamente]".
As lesões por esforço repetitivo e os problemas da coluna
estão entre as principais enfermidades ocupacionais que
acometem os empregados desse setor. Há casos reconhecidos
pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) de
doenças do trabalho, principalmente nos pulsos, mãos e
ombros, diretamente relacionados ao esforço repetitivo e ao
frio. A exposição a baixas temperaturas dificulta a
circulação de sangue nas extremidades do corpo.
"Por isso foi tão importante a juíza conceder essa liminar.
Assim, vamos conseguir resguardar os direitos dos
trabalhadores ao longo do processo, pois pode demorar até o
julgamento do mérito da causa", diz a procuradora Flávia.
"Agora, se eles não cumprirem, vão ter pagar as multas. Para
ele [empregador] foi bem ruim, teria sido melhor assinar o
TAC. Mas ficamos bem satisfeitos porque em cinco dias
já vamos poder começar a fiscalizar se o frigorífico está
cumprindo as regras", comemora.
A liminar prevê ainda que sejam aplicadas multas que variam
de R$ 1 mil a R$ 10 mil, caso o frigorífico não cumpra as
exigências previstas no texto. Se as multas forem aplicadas,
os valores serão revertidos para o Fundo de Amparo ao
Trabalhador (FAT).