As
mulheres representam quase metade da mão-de-obra
- entre 40 e 45% - do ramo econômico que
mais cresce no país: comércio e serviços.
São comerciárias; trabalhadoras
domésticas; de asseio e conservação;
assessoria, perícia e pesquisa; de
telemarketing; hotelaria, bares e
restaurantes, entre outras, cujo dia a
dia muitas vezes supera a já conhecida
tripla jornada.
Enquanto de um lado a imprensa noticia o
desempenho econômico cada vez maior do
ramo de comércio e serviços – que em
2008 cresceu por volta de 10% - , do
outro lado, trabalhadores e
trabalhadoras experimentam uma
sobrecarga cada vez maior, especialmente
as mulheres.
“Trabalhar é necessário e gratificante,
mas viver somente em função do trabalho
é desumano. A categoria comerciária e de
serviços, muitas vezes, trabalha em
condições desumanas. Além do local de
trabalho não oferecer saúde e segurança,
do assédio moral e sexual serem parte da
rotina, ainda há o trabalho aos domingos
e feriados”, salienta Lucilene
Binsfeld, presidenta da Confederação
Nacional dos Trabalhadores no Comércio e
Serviços da CUT – CONTRACS.
Lucilene
denuncia: “Temos relatos de
trabalhadoras que entram em pânico aos
sábados e vésperas de feriados, quando a
empresa em que trabalham anuncia o
funcionamento aos domingos e feriados.
CONTRACS e CUT têm uma
luta histórica para acabar com essa
situação, sem falar na luta geral pela
redução da jornada, sem redução de
salários que vai pôr fim às jornadas
desumanas e ainda gerar empregos”.
“F.”, ex-trabalhadora de uma grande rede
comercial com lojas em todo o Brasil,
cita a dificuldade de ficar longe da
família aos domingos e feriados como
pior momento de sua carreira. Enquanto
trabalhou no comércio, “F.” quase não
encontrava as filhas, que tinham 10 e 8
anos: “quando eu saía, pela manhã bem
cedo, elas estavam dormindo e quando eu
voltava lá pelas dez da noite, elas já
estavam dormindo de novo”.
Histórias como essa estão mais para
regra do que para exceção: “o que mais
encontramos são trabalhadoras no
comércio e serviços sobrecarregadas com
uma jornada incompatível com qualquer
pessoa. Além disso, o assédio moral e as
lesões por esforços repetitivos (LER)
são causadores de danos irreparáveis aos
trabalhadores/as e nós precisamos mudar
isso”, destaca Maria Isabel Caetano
dos Reis, Secretária de Organização
do Setor de Serviços e presidenta do
Sindiserviços do DF.
Jornada excessiva, desigualdade,
distanciamento da família, problemas de
saúde causados por condições de trabalho
inadequadas e relações humanas perversas
no trabalho que geram assédio moral e
sexual perseguem as trabalhadoras do
ramo de comércio e serviços.
Depois de uma semana exaustiva de
trabalho, que chega a beirar 56 horas
semanais nos grandes centros urbanos,
com muita hora-extra – muitas vezes não
pagas - e fadiga física e emocional, as
trabalhadoras se perguntam: para quê
trabalhar nos domingos e feriados se os
filhos estão em casa, as creches não
funcionam, há menos ônibus e menos
segurança nas ruas? Será que milhões de
trabalhadores/as do ramo de comércio e
serviços precisam padecer de tanto
trabalhar? São perguntas que as
trabalhadoras fazem à sociedade. Alguém
se habilita a responder?
Se a resposta for difícil, a CONTRACS/CUT
convida os leitores/as a realizarem uma
experiência: se você não é trabalhador/a
do ramo de comércio e serviços, sente-se
por um instante - porque cansa - e
imagine: fazer duas horas-extras por dia,
além do tempo de deslocamento até o
trabalho. Depois imagine ter horário
rígido para entrar e não ter hora para
sair. Pense em trabalhar o sábado
inteiro, o domingo todo e nos feriados
também. E quando você descansar, a cada
15 dias, isso ocorrer durante a semana
quando todos de sua casa estiverem
trabalhando. Inclua nessa experiência,
acabar com as idas ao cinema, com o
passeio no parque, com a possibilidade
de estudar, com a conversa com os amigos
e com a convivência com os filhos.
Depois de se imaginar nesse quadro, em
que estão milhões de trabalhadoras do
ramo de comércio e serviços, como você
se sentiu? Se a sua experiência
imaginativa não foi boa, você pode
imaginar como é difícil o dia a dia de
uma trabalhadora cuja jornada não é só
tripla... muitas vezes é cruel.
Reduzir
para humanizar
A redução da jornada de trabalho sem
redução de salários é uma importante
decisão que a sociedade deve tomar e
especialmente um grande investimento
social.
Emprego, renda e qualidade de vida são
os principais benefícios da redução da
jornada para a sociedade, especialmente
para a mulher trabalhadora. “Mais tempo
para cuidar da saúde, mais tempo para a
maternidade, para a família, para
estudar e para si mesma. À mulher não
compete apenas a condição de
trabalhadora, este é apenas um papel,
dos diversos que a mulher desempenha.
Trabalho não pode significar prisão e
opressão”, lembra Geralda Godinho
Sales, Secretária Geral da
CONTRACS/CUT e presidenta do
Sindicato dos Comerciários do DF.
A luta
para mudar mentalidades
A CONTRACS e a CUT
enfrentam o problema em vários níveis e
de variadas formas. “É estratégia da
CUT apoiar efetivamente a
participação das mulheres nos sindicatos
e instâncias da CUT, com a
formação de coletivos de mulheres,
debates, campanhas e manifestações. Ou
seja, ações concretas são realizadas em
todo o Brasil para criar uma nova
mentalidade que garanta justiça e
igualdade de oportunidades de gênero e
raça. Lutar por igualdade de
oportunidades, por condições dignas de
trabalho e pela qualidade de vida dos
trabalhadores/as faz parte de nosso
trabalho, dia a dia”, explica Ione
Santana de Oliveira, Secretária de
Política de Promoção para a Igualdade
Racial da CONTRACS/CUT e
diretora da FENATRAD - Federação
Nacional das trabalhadoras Domésticas –
BA.
A CONTRACS/CUT trabalha
aliada à política da Secretaria Nacional
sobre a Mulher Trabalhadora (SNMT) da
CUT, que tem como uma de suas
diretrizes incentivar os sindicatos a
incluírem em suas convenções e acordos
coletivos de trabalho cláusulas que
atendam as necessidades das mulheres
trabalhadoras. “Também faz parte da
política da SNMT/CUT a
capacitação das companheiras dirigentes
sindicais para negociação coletiva.
Direito à creche, redução da jornada,
melhores condições de trabalho são lutas
que a CUT e a Contracs incentivam
em todo o país e que devem estar
expressas, materializadas nas convenções
coletivas”, detalha Mara Luzia Feltes,
da Secretaria da Mulher da CONTRACS/CUT
e diretora do SEMAPI - Sindicato
dos Empregados em Empresas de
Assessoramento, Perícias, Informações e
Pesquisas e de Fundações Estaduais do RS
Para Mara, falar dos problemas do
ramo é importante para que
trabalhadores/as e sociedade saibam como
o capital oprime o trabalho, mas as
ações para mudar são mais importantes
ainda. “Falar de um problema sem definir
as formas de atuação para a mudança não
melhora a situação. A ação pautada na
realidade é nossa principal meta na
CONTRACS/CUT. Sem falar que
mudar uma mentalidade/ideologia vigente
é um processo longo que exisge tempo e
investimento. Mãos (femininas e
masculinas) à obra”.