Por sete votos a
quatro, conselho de ministros decide liberar
duas variedades de milho transgênico produzidas
por empresas transnacionais. Decisão sacramenta
opção do atual governo pelos transgênicos e
contraria o movimento socioambientalista.
Reunido na terça-feira (12), o Conselho Nacional de
Biossegurança (CNBS) aprovou a liberação
comercial de duas variedades de milho
transgênico produzidas pelas empresas
transnacionais Bayer e Monsanto.
Esta é a primeira vez que o milho transgênico é
liberado no país. Antes, o governo federal já
havia liberado a soja e o algodão transgênicos.
Com esta decisão, o CNBS, colegiado
composto por onze ministérios, confirma a opção
do atual governo pelos transgênicos e coloca o
Brasil como um dos poucos países do mundo
a se abrir para esse tipo de produção.
O placar apertado da votação no CNBS -sete votos a
quatro- demonstra que o tema ainda é alvo de
intensas divergências no seio do governo Lula.
Na reunião, presidida pela ministra-chefe da
Casa Civil, Dilma Rousseff, votaram
contra a liberação das duas variedades de milho
transgênico os ministérios da Saúde, do
Desenvolvimento Agrário e do Meio Ambiente, além
da Secretaria Especial da Pesca. A favor dos
transgênicos, votaram a Casa Civil e os
ministérios da Agricultura, da Ciência e
Tecnologia, do Desenvolvimento, da Justiça, da
Defesa e das Relações Exteriores.
Principal opositora da liberação dos transgênicos no CNBS,
a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva,
não pôde comparecer à reunião do conselho, pois
havia sido convocada pelo presidente Luiz
Inácio Lula da Silva para acompanhá-lo na
viagem à Guiana Francesa, onde o
presidente brasileiro foi encontrar o presidente
da França, Nicolas Sarkozy. Do
lado pró-transgênicos, o mais entusiasmado era o
ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio
Rezende: “Essa decisão histórica vai colocar
o Brasil entre os países mais modernos na
área agrícola”, repetia, após a votação.
Rezende
também dava garantias aos repórteres de que “o
milho transgênico é seguro para o consumo
humano”. A opinião do ministro é idêntica à da
Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio),
órgão subordinado ao MCT, que já havia aprovado
a liberação comercial do Liberty Link (Bayer)
e do MON810 (Monsanto) há dois anos. A
decisão da CTNBio, no entanto, foi
contestada na Justiça e também dentro do governo,
sobretudo pela Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa, subordinada ao
Ministério da Saúde) e pelo Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama, subordinado ao MMA),
fato que fez com que a decisão final fosse
remetida ao CNBS.
A Anvisa havia solicitado ao CNBS “a imediata
suspensão da liberação do milho MON810”,
por avaliar que “os dados apresentados pela
Monsanto não permitem concluir sobre a
segurança de seu uso para consumo humano”. O
Liberty Link, por sua vez, teve a anulação
de sua liberação pedida pelo Ibama “em razão da
inexistência de estudos ambientais sobre o
produto”. O Ibama também alertou aos
ministros que “caso a liberação comercial do
milho transgênico seja aprovada, a contaminação
das variedades crioulas, orgânicas e ecológicas
ocorrerá inevitavelmente”.
“A
decisão política do governo Lula, de
colocar o agronegócio acima da saúde
da população, do meio ambiente e da
agrobiodiversidade, é uma grande
irresponsabilidade que marcará seu
mandato” |
O fato de os dois ministérios com maior especialização sobre
questões ligadas à saúde humana e ao meio
ambiente se posicionarem claramente contra a
liberação do milho transgênico não impediu a
vitória do grupo pró-transgênicos no CNBS.
Assim sendo, o governo brasileiro marcha na
contramão de diversos outros países que
recentemente proibiram o Liberty Link e o
MON810 em seus territórios -como, por
exemplo, a Hungria (2006), a Áustria
(2007) e a França (2008)- justamente por
considerar que estes produtos podem trazer risco
à saúde humana e ao meio ambiente.
“Decisão vai
marcar mandato”
Em nota pública divulgada logo após a reunião do conselho de
ministros, as organizações do movimento
socioambientalista que compõem a Campanha por
um Brasil Livre de Transgênicos afirmaram
que “a decisão política do governo Lula,
de colocar o agronegócio acima da saúde da
população, do meio ambiente e da
agrobiodiversidade, é uma grande
irresponsabilidade que marcará seu mandato”.
Para Isidoro Revers, que é dirigente da Comissão
Pastoral da Terra, a decisão do CNBS “foi
absurda” e deve ser contestada: “As duas
autoridades competentes para avaliar os impactos
à saúde humana e ao meio ambiente se
posicionaram contra as liberações comerciais. É
muito contraditório que os outros ministros, que
não têm competência sobre a saúde e o meio
ambiente, tenham passado por cima desta decisão”,
diz.
Revers
também afirma considerar a decisão do governo um
ataque aos pequenos agricultores: “Essa decisão
atenta contra o direito dos agricultores, que
perderão suas variedades tradicionais e crioulas,
e dos consumidores, que não terão opção de uma
alimentação saudável e não transgênica, já que
não haverá controle da contaminação”, diz.
Coordenadora do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec),
Andréa Salazar considera “um absurdo que
as empresas de biotecnologia continuem
negando-se a realizar os estudos exigidos pelas
autoridades da área de saúde”. Ela também
promete que a luta contra a liberação do milho
transgênico não se esgotará após a derrota no
CNBS: “Vamos continuar alertando os
consumidores brasileiros sobre os riscos do
milho transgênico. A Anvisa deixou bem
claro que estas variedades não são seguras à
saúde humana”, diz Andréa.
Maurício Thuswohl
Agencia Carta Maior
21 de fevereiro de 2008