Brasil

12 de junio
Día Mundial contra el Trabajo Infantil

 

Matadouros públicos irregulares abrigam trabalho infantil

 

Fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) flagra crianças e adolescentes trabalhando em abatedouros municipais. Prefeituras de Nova Cruz, João Câmara e São Paulo do Potengi declaram ter tomado providências

 

Quando se lembra do cheiro de sangue, da agonia do boi morto a marretadas em galpões sem as mínimas condições sanitárias e do desespero de crianças e adolescentes que trabalham em matadouros do Rio Grande do Norte por sobras de animais para suprir a alimentação da família, a auditora fiscal do trabalho Marinalva Cardoso Dantas utiliza a expressão "circo de horrores".

 

Algumas cenas registradas pela experiente Marinalva -que atuou coordenando o grupo móvel do trabalho escravo por nove anos- durante as fiscalizações realizadas nos municípios de Nova Cruz (março deste ano), João Câmara e São Paulo do Potengi (ambos no final de maio) foram capturadas de modo sui generis: "Apontava a câmera, fechava os olhos e apertava o botão".

 

"O pai de uma das crianças dos municípios visitados declarou que cria os filhos lá dentro e que vive no matadouro desde os oito anos", relata. Adolescentes "fazem" (laçam, desferem marretadas, sangram, retalham, tiram o couro e as vísceras) o boi sob a supervisão dos marchantes (compradores de gado vivo que revendem a carne para consumo); crianças retiram as fezes das tripas, recolhem o fel (bile) e fazem qualquer tipo de serviço sujo em troca de uma pelanca (sebo) ou um pedaço de miúdo para colocar no feijão.

 

"Tivemos muita dificuldade para a abordagem às crianças, porque todas corriam e se escondiam quando nos aproximávamos, inclusive fugiam para a rua", descreve Marinalva no relatório sobre a inspeção em Nova Cruz (RN). O ambiente "hostil e violento", completa, não chegou a impedir filmagens e a gravação de depoimentos curtos de alguns dos presentes, mas impossibilitou que a fiscalização entrevistasse formalmente as pessoas.

 

A fiscalização do matadouro municipal de Nova Cruz se deu por conta de uma solicitação do Conselho Tutelar do município. "Conversamos primeiro com a Secretaria de Ação Social do município. Como a situação continuava do mesmo jeito, consultamos o Conanda [Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente] e depois tivemos que acionar o Ministério do Trabalho e Emprego", recorda Grécia Maria Vieira, que faz parte do Conselho Tutelar de Nova Cruz, que cumpre agora a difícil tarefa de identificar os pais e responsáveis dos jovens.

 

Em função do que se constatou em Nova Cruz, o promotor Antonio Carlos Lorenzetti de Mello, do Ministério Público Estadual do Rio Grande do Norte, expediu a recomendação de Número 2/2008, publicada no dia 7 de maio de 2008 no Diário Oficial do Estado. No documento, Antonio Carlos aponta medidas para que sejam cumpridas pela prefeitura. O promotor pede que a Secretaria de Ação Social do município identifique e cadastre as crianças e adolescentes envolvidas em atividades no matadouro municipal em programas sociais e solicita o fechamento do acesso aos matadouros, restringindo o acesso somente a pessoas com mais de 18 anos.

 

O promotor também recomenda a presença de uma guarnição do Batalhão de Polícia Militar da região (8º BPM) na entrada do matadouro nos dias de abate, "tendo em vista o uso de arma de fogo naquele local e, em especial, a permanência de crianças e adolescentes no matadouro". Por fim, o documento pede providências (no prazo de 60 dias) no que diz respeito à celebração de convênio com o Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio Grande do Norte (Emater), órgão do governo estadual, para a construção de um novo matadouro e uma pocilga em terreno apropriado.

 

De acordo com João Severino da Cunha, chefe de gabinete da Prefeitura de Nova Cruz, a administração municipal tomou providências logo que recebeu as recomendações da promotoria. Ele admite que o estabelecimento "arcaico" funciona há mais de 30 anos e está completamente "fora dos padrões do que exige a norma de saúde e segurança do trabalho".

 

"Vamos fechar as portas do matadouro e construir um novo", promete João Severino, confirmando previsão do convênio com a Emater. O terreno de 1 mil m2 localizado a 3 km do centro da cidade, dotado de infra-estrutura de água e energia elétrica, já foi adquirido, garante o chefe de gabinete do prefeito Cid Arruda Câmara (PMN). Falta agora a licitação para a obra. "Apenas com recursos próprios, fica difícil. Pegamos a prefeitura muito defasada em termos de estrutura e investimos no hospital da cidade. Temos 35 mil habitantes e é difícil melhorar todas as áreas".

 

Segundo Grécia, do Conselho Tutelar, porém, as crianças não entram mais, mas ainda rondam o matadouro. "Não queremos que eles fiquem nem por perto. Se isso continuar, acionaremos a promotoria com um pedido para que o matadouro seja fechado".

 

O promotor Antonio Carlos conta que já tinha firmado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a prefeitura para que as crianças fossem incluídas no Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti) e diz que já solicitou novas fiscalizações do MTE. O problema dos matadouros, avalia, vai além do trabalho infantil e envolve um conjunto de lacunas graves nas questões sanitárias, desde vacinação a guias de transporte até o funcionamento de matadouros clandestinos à venda em feiras livres. Ou seja, a exploração do trabalho infantil se encaixa a um "mercado" paralelo.

 

Ele aposta, portanto, na construção dos novos matadouros no convênio com a Emater como forma de superação do quadro atual. E dá o prazo de um ano para que o novo espaço seja aberto. "Estabelecemos multa em caso de descumprimento e o matadouro pode até ser fechado. É uma questão grave, mas que leva tempo para ser solucionada", projeta.

 

Maurício Hashizume

Tomado de Reporter Brasil

12 de junho de 2008

 

 

Foto 1: Estabelecimento municicipal de Nova Cruz funciona há mais de 30 anos (Foto:SRTE-RN)

Foto 2: Criança trabalha no matadouro de Nova Cruz; prefeitura aguarda novo galpão (Foto:SRTE-RN)

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