Horas extraordinárias e sem feriados como sistema
O lema da Nestlé
Chile –empresa
que chega aos 950 milhões de dólares em vendas anuais– é produzir mais a
qualquer custo e,
quando os custos ultrapassam a fatura, são sempre os trabalhadores os
responsáveis por pagá-la. A empresa converteu
as horas extras –que como a norma indica são aquelas que superam a jornada
habitual de trabalho contínuo– em permanentes, provocando uma série de
distorções nas condições e no ambiente de trabalho que afetam seriamente os
trabalhadores. Esta situação, que foi reiteradamente denunciada pelos
sindicatos, não tem solução de continuidade se levarmos em consideração as
vítimas que está provocando.
A última
foi Aldo
Saavedra,
quem no domingo passado, 3 de maio, perdeu uma falange de um dedo da sua
mão, em um acidente de trabalho ocorrido na fábrica de congelados do
Complexo Macul. Mesmo que Aldo tenha
tirado uma proteção da máquina que estava operando, a causa do acidente vai
mais além de um erro do operário. Havia três semanas que Aldo
estava trabalhando sem descanso semanal. No sábado, dia 2, trabalhou de 7 às
14 horas e, neste mesmo dia, voltou a trabalhar a partir das 23 horas, sendo
que às 3 horas do domingo ocorreu o acidente.
Além das
violações à legislação vigente, até que ponto a sucessão de jornadas de
trabalho sem o correspondente descanso semanal influiu no acidente? Abundam
os estudos mostrando que esta forma de intensificação do trabalho se traduz
em mais acidentes de trabalho, patologias cardiovasculares, estresse,
perturbações do sono e depressão, tudo o que a
Nestlé sabe
ou deveria saber.
As horas
extras como arma antissindical
A urgência
de produzir é tamanha, que na fábrica de congelados se trabalhou até no dia
1º de Maio passado. Mesmo que o trabalhador possa optar por trabalhar ou não
nos feriados, o que ocorre é que ele se vê diante da alternativa de ir
trabalhar ou ser despedido. Na Direção do Trabalho existe uma denúncia do Sindicato
dos Trabalhadores Nº 1 da Nestlé Chile Divisão H.R.
onde a empresa é acusada de ter despedido 20 trabalhadores sindicalizados
durante 2008 e 16 trabalhadores sindicalizados até março de 2009. Todos eles
-com contrato de trabalho indefinido e alguns com 15 e 20 anos na companhia-
foram despedidos recorrendo ao nefasto artigo 161 do Código do Trabalho:
“necessidades da empresa”. A partir do momento em que os despedidos foram
imediatamente substituídos por trabalhadores novos, a suposta necessidade se
converte em um argumento grosseiro e enganoso.
Como se o
fato anterior fosse pouco, o Sindicato também denunciou um comunicado ao
pessoal exibindo a foto da Sra. Ivonne
Avilés,
Chefe (sic) de
Recursos Humanos da Nestlé
Macul,
onde, configurando uma clara medida antissindical, responsabiliza o
Sindicato pela suspensão das horas extras*. O que a Sra. Avilés não
diz, é que a fiscalização, a que faz referência no número 1, foi solicitada
devido ao seu interesse de que os salários gerados no domingo passado, 7 de
dezembro, fossem pagos sem nenhuma sobretaxa.
Agora, esta
senhora que prefere ser “Chefe” e não “Chefa”, corre o risco de estar
gerando outra denúncia, já que ordenou a colocação de câmeras de TV nos
vestiários dos trabalhadores e, diante do protesto dos dirigentes sindicais,
argumentou: “não se preocupem, pois não estão conectadas”.
Inadequadas condições de saúde e segurança
Estas
são as condições e o clima em que se trabalha na fábrica Macul da
Nestlé Chile. Existem outras condições de trabalho inadequadas, das
quais nos ocuparemos em uma próxima entrega, entre outras:
1) Nas tarefas de limpeza usa-se peróxido de hidrogênio, composto
químico que, em baixa concentração, é conhecido como “água oxigenada”. Como
os exaustores da fábrica não renovam o ar suficientemente rápido, vários
trabalhadores notam que os seus cabelos estão ficando com uma coloração
amarelada. Muito mais do que converter à força os trabalhadores em loiros,
não se sabe nada ainda sobre as consequências internas, especialmente no
aparelho respiratório.
2) Também
se utiliza cloro na limpeza e, quando este se mistura com os detergentes
usados com o mesmo fim, se produz uma reação denominada “bomba” pelos
trabalhadores. Se considerarmos que o cloro foi utilizado como arma na
Primeira Guerra Mundial e recentemente na Guerra do Iraque, o qualificativo
não é nem um pouco exagerado.
3) Em
algumas seções, os trabalhadores devem levantar pesos próximos aos 80
quilos, em clara violação à legislação vigente.
Declaram-se responsáveis sem envergonhar-se
Apesar das
anormalidades assinaladas, a Nestlé
Chile se
esforça para manter a imagem de uma companhia que respeita os princípios
contidos
–e geralmente não cumpridos– na chamada responsabilidade social
empresarial. Fernando
del Solar,
Presidente Executivo da Nestlé no Chile, foi
eleito em 2007 diretor da Acción
RSE,
associação que, de acordo com o seu Web site, pretende “sensibilizar,
mobilizar e apoiar as empresas para administrar os seus negócios de forma
socialmente responsável”. Para isso, uma das cinco áreas de ação que
promove, é a “Qualidade de Vida Trabalhista” (sic). Supomos que Don
Fernando não
tenha assistido a nenhuma das reuniões convocadas sobre este assunto.
Em outra
ordem e como uma forma de mostrar por onde passam as preocupações do
governo, Marigen
Hornkohl,
ministra chilena da Agricultura,
acaba de visitar a
Suíça,
onde foi entrevistada por Paul
Bulcke,
CEO da Nestlé,
para quem propôs que a companhia se unisse à aliança estabelecida com as
autoridades holandesas (Unilever mediadora?) para estabelecer um
centro de excelência em matéria de inovação alimentar.
Chegou
Pappalardo e botou para quebrar
Carlos
Pappalardo é
um engenheiro argentino que em 2003 chegou à República
Dominicana,
mais concretamente na fábrica da Nestlé em San
Francisco de Macorís.
O gerente regional o nomeou gerente geral da tal fábrica, contrariando a
opinião da direção local, com o argumento de que se deveriam instalar novas
máquinas e era necessário reduzir as paradas de produção. Logo Pappalardo começou
a demonstrar uma personalidade autoritária e prepotente, justificada pela
sua forma particular de entender o mando: “sem negócio perco a autoridade”.
Os trabalhadores o apelidaram de “o pequeno Hitler” e durante a sua gestão
aconteceram injustificadas demissões em massa e o desconhecimento dos
direitos trabalhistas. As condições de trabalho não eram algo que lhe
tirasse o sono, em 2003 um trabalhador denunciava: “trabalhamos a 32, 33
graus de temperatura e com níveis de ruído de 85 decibéis… trocamos de
camisa quatro ou cinco vezes por dia, transpiramos até quando descansamos”.
As coisas
chegaram a tal ponto que Pappalardo deixou
de ser um problema para o sindicato, para se converter em um problema para
as forças vivas da sociedade de São Francisco de Macorís. Em 2005, 200
dirigentes de base do Fórum
Social Alternativo da província de Duarte se
reuniram em frente à fábrica da Nestlé
–fortemente protegida por soldados do Exército– com
a finalidade de entregar um documento manifestando seu apoio ao sindicato e
solicitando a reintegração dos trabalhadores injustificadamente despedidos.
Pappalardo abandonou
a República
Dominicana tão
inesperadamente como chegou e por mais de um ano não soubemos onde estava.
Agora sabemos que durante esse tempo ficou em algum escritório da Nestlé em
Santiago, aparentemente com a intenção de que nos esquecêssemos dele. Agora
acaba de aparecer como gerente da fábrica Graneros** e
é bom que saiba que o temos muito presente. E mais, pensamos que muito em
breve começará a dar o que falar.